Com o decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva
(Decreto nº 6.040), publicado no Diário Oficial da União na
quarta-feira (7), o governo reconhece formalmente, pela primeira vez na
história do País, a existência formal de todas as chamadas populações
“tradicionais” do Brasil. Ao longo dos seis artigos do decreto, que
institui a PNPCT – Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos
Povos e Comunidades Tradicionais, o governo estende um reconhecimento
feito parcialmente, na Constituição de 1988, apenas aos indígenas e aos
quilombolas. As negociações que culminaram no decreto tiveram
participação direta da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e do
ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias.
Daqui em diante, todas as políticas públicas,
decorrentes da PNPCT, beneficiarão oficialmente o conjunto das
populações tradicionais, incluindo ainda faxinenses (que plantam mate e
criam porcos), comunidade de “fundo de pasto”, geraizeiros (habitantes
do sertão), pantaneiros, caiçaras (pescadores do mar), ribeirinhos,
seringueiros, castanheiros, quebradeiras de coco de babaçu, ciganos,
dentre outras.
Tais políticas serão desenvolvidas pela Comissão
Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades
Tradicionais. “Elas terão como objetivo central promover o
desenvolvimento sustentável, com ênfase no reconhecimento,
fortalecimento e garantia dos direitos territoriais, sociais,
ambientais, econômicos e culturais, além de respeito à valorização de
identidade daquelas populações, às suas formas de organização e às suas
instituições”, sublinhou o diretor de Agroextrativismo do Ministério do
Meio Ambiente, Jorge Zimmermann.
Definição – Segundo o artigo 3 º do
decreto, povos e comunidades tradicionais “são grupos culturalmente
diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias
de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos
naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa,
ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas
geradas e transmitidas pela tradição.
Tais populações – a maior parte sem documentos de
identidade, totalmente à margem dos direitos civis – habitam sobre um
quarto do território brasileiro, em todas as regiões do País, formando
um contingente de cerca de 5 milhões de pessoas, equivalente à população
de muitos países europeus. “De forma inédita, o governo brasileiro
reconhece o Brasil como um estado pluriétnico; assim, abre
possibilidades de gestão mais enriquecedora para o conjunto da sua
população”, disse Zimmermann.
Ações – Com base na Política
Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades
Tradicionais, as várias instâncias do governo federal, de forma
integrada entre si e com as lideranças das comunidades tradicionais,
poderão, juntas, desenvolver planos, projetos e ações destinados a
promover a inclusão daquelas populações.
Muitas ações nesse sentido já são desenvolvidas hoje,
como, por exemplo, as Reservas Extrativistas (Resex), criadas e geridas
pelo Ibama. “Mas, de agora para a frente, aquelas ações poderão ser
realizadas de forma ainda mais articulada dentro do governo e, por isso
mesmo, ter seus efeitos potencializados. O trabalho buscará sempre o
desenvolvimento sustentável, ou seja, o uso equilibrado dos recursos
naturais”, enfatiza o diretor.
Eixos – Segundo Zimmermann, são três
as diretrizes centrais da PNPCT. A primeira delas pretende assegurar
todos os direitos civis, por meio do reconhecimento legal dos habitantes
daqueles habitantes, inclusive com fornecimento de documentos de
identificação; a segunda diretriz diz respeito ao reconhecimento
explícito do respeito à diversidade étnica, ao direito à educação
diferenciada e à prática religiosa específica. A terceira perna do tripé
pretende equacionar a regularização fundiária, já que muitas das
comunidades tradicionais sofrem com o desrespeito à sua referência
geográfica, como é o caso dos quilombolas, que, em muitos casos, foram
incorporados pelas cidades, sofrendo achaques da especulação
imobiliária.
“Havia uma ausência de marcos legais que garantissem
direitos às populações tradicionais. Agora, porém, com o decreto, temos
uma situação em que, com amparo da PNPCT, podemos transformar a
realidade daqueles povos positivamente”, diz Zimmermann. Até porque,
insiste ele, o País vive um momento em que a especificação profissional e
as novas tecnologias roubaram praticamente todos os espaços para a
migração das populações tradicionais da zona rural para as cidades. Com o
PNPCT, o governo pretende criar condições para que aquelas pessoas
encontrem maneira de viver digna em seu próprio meio ambiente.
Uma das primeiras providências, segundo o diretor,
será tentar incluir as ações integradas (governo/populações) no Plano
Plurianual (PPA), o que possibilitaria estruturar melhor atividades
voltadas àquela população, inclusive pela vinculação de dotação
orçamentária.
Até a redação do texto do decreto, foi um longo
processo de discussão. Numa comissão democrática, que juntou 15
representantes de vários setores do governo e 15 representantes das
comunidades tradicionais, as sugestões e críticas de todos foram
colhidas no período de um ano. Foram cinco grandes reuniões regionais,
realizadas no Acre, no Pará, em Pernambuco, no Paraná e na Bahia. “No
decorrer dos encontros, a sensação foi de que aos poucos, juntos,
aquelas comunidades foram sendo retiradas da invisibilidade”, diz
Zimmermann. (Ruben Junior/ MMA)
Legislação - Povos e Comunidades Tradicionais
Documentos
|
Decreto de 07 de fevereiro de 2007 "Institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais" |
Decreto de 13 de julho de 2006 "Altera a denominação, competência e composição da Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável das Comunidades Tradicionais" |
Decreto de 27 de dezembro de 2004 "Cria a Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável das Comunidades Tradicionais" |
Convenção nº 169 da OIT, de 07 de junho de 1989 (Decreto nº 5.051/2004) |
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