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sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Seis meses: 270 adolescentes mortos A MAIORIA NEGROS, PARDOS E IMPRETERIVELMENTE POBRES DAS PERIFERIAS DA REGIAO METROPOLITANA...

Ricardo Araújo - repórter

De tristes lembranças e lamentações, vivem as famílias dos 270 adolescentes mortos em Natal nos primeiros seis meses deste ano. Entre 2010 e 2013, a prática de crimes contra adolescentes cresceu 300%, segundo levantamento do Poder Judiciário potiguar. O percentual de adolescentes mortos nos primeiros seis meses deste ano chegou a 83,59% do total de óbitos registrados na faixa etária de 14 a 21 anos ao longo de 2012. Em paralelo, o cometimento de atos infracionais por aqueles que, sequer saíram da puberdade, aumentou significativamente e migrou para crimes cada vez mais violentos. Os pequenos furtos de pacotes de biscoitos, revistas de campeonato de futebol cometidos no passado, evoluíram para assaltos à mão armada, homicídios, latrocínios e estupros, nos dias de hoje.  
Vlademir AlexandreNas ruas, crianças e adolescentes ficam vulneráveis, se envolvem cada vez mais com as drogas e terminam entrando para a triste estatística da criminalidadeNas ruas, crianças e adolescentes ficam vulneráveis, se envolvem cada vez mais com as drogas e terminam entrando para a triste estatística da criminalidade

A inaplicabilidade de políticas públicas de Assistência Social, somadas ao desmantelamento da infraestrutura básica de Saúde, Educação e Segurança Públicas, geram impunidade e o descrédito do Poder Judiciário que, por falta de vagas nas unidades socioeducativas, põe em liberdade os adolescentes infratores. “A tendência é piorar. Eu não vejo perspectiva de mudanças nos próximos seis meses. Até o final do ano, iremos ao fundo do poço”, avalia o juiz titular da 1ª Vara da Infância e Juventude de Natal, José Dantas de Paiva. A principal causa do envolvimento dos adolescentes com práticas infracionais complexas, é o fácil acesso à drogas como o crack, que causam rápida dependência e necessidade constante de consumo. 

 Além disso, as brigas entre gangues de torcidas organizadas tem contribuído para o aumento das estatísticas das mortes entre os adolescentes e não somente entre os rapazes. Recentemente, uma menina esfaqueou uma rival, que acabou morrendo dias depois. Tudo por causa de times de futebol. O Poder Judiciário registrou, também, um aumento nos casos de violência doméstica contra pessoas com idades entre 14 e 21 anos, os quais incluem estupro e espancamento, primordialmente. “Estamos numa guerra civil”, lamentou o juiz José Dantas de Paiva. E são justamente os adolescentes, os anti-heróis das guerras contemporâneas. Utilizando-se do álibi da maioridade incompleta, assumem crimes que são, em muitos casos, são praticados por maiores de 18 anos. “Os adolescentes hoje não estão sendo responsabilizados. Ele sabe que, se cometer um ato infracional, não terá para onde ir”, asseverou o magistrado José Dantas de Paiva. 

 Como consequência, a sociedade lamenta a sensação de impunidade, pois a realidade mostra que a reincidência na prática de atos infracionais é comum entre os adolescentes egressos das instituições socioeducativas. Isto porque, não há vagas nas unidades dos Centro Educacionais (Ceducs) nem nos Centros Integrados de Atendimento ao Adolescente Infrator (Ciad). E quando elas estão disponíveis, a ressocialização não ocorre da forma que está disposta nos manuais. “Sem vagas, os juízes são obrigados a colocar os adolescentes infratores em liberdade”, destacou o magistrado. De volta às ruas, a realidade volta a ser a de antes: prática de atos infracionais – apreensão - encaminhamento para o sistema socioeducativo - falta de vagas - liberdade. 

 Questionado sobre o perfil dos adolescentes mortos e dos que cometem atos infracionais em Natal atualmente, o juiz José Dantas de Paiva disse que, geralmente, são filhos de pais humildes, mas nem todos com histórico criminal. A maioria dos adolescentes infratores não frequentaram escola, não são portadores de registro de nascimento e utilizam a droga como rota de fuga. Somente na 1ª Vara da Infância e da Juventude de Natal, 1.060 processos estão em tramitação.





Um dos órgãos de defesa dos direitos da criança, o Conselho Tutelar, não funciona a contento em Natal. Das quatro unidades espalhadas por cada região administrativa da capital, uma está fechada (Zona Sul) e as outras três (Zonas Norte, Leste e Oeste) funcionam parcialmente. Em decorrência da falta de papel, toner para impressora e gasolina para os carros, os conselheiros ficam impossibilitados de ir até onde as crianças em situação de risco estão ou até mesmo requisitar procedimentos via ofício às Secretarias Municipais de Saúde, Educação e Assistência Social. O atendimento se resume, por enquanto, à orientação verbal nas sedes dos Conselhos.

 No Conselho Tutelar da Zona Leste, na rua Felipe Camarão, o prédio ficou funcionando somente por um turno durante dois meses em decorrência do corte de energia elétrica, por falta de pagamento. O aluguel do prédio não é pago há 11 meses e a imobiliária judicializou a causa. Os conselheiros reclamam que, depois que o Ministério Público Estadual recomendou que a Prefeitura de Natal gerisse os recursos destinados aos Conselhos – R$ 15 mil/mensais – a situação piorou. Eles creditam o desmantelo à burocracia na tramitação dos processos no Executivo Municipal.

 “Os Conselhos Tutelares perderam qualidade desde que a Prefeitura deixou de efetuar os repasses. Há um descrédito do órgão pela população”, lamentou o conselheiro Pedro Gomes. Da média diária de 20 atendimentos no passado, o Conselho Tutelar da Zona Leste realiza, atualmente, cinco atendimentos diários, no máximo. Ele criticou a falta de políticas municipais contra o uso de drogas por crianças e adolescentes e a falta de clínicas de internação para recuperação de drogados. 

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