Renato Santana
De Brasília
O
saldo é de um indígena assassinado, quatro desaparecidos e uma porção
de feridos no acampamento Tekoha Guaiviry, entre os municípios de
Amambai e Ponta Porã (MS), onde uma comunidade Kaiowá Guarani foi
atacada por um grupo com cerca de 40 pistoleiros - munidos com armas de
groso calibre - na manhã desta sexta-feira (18).
Os
números deverão ser mais bem esclarecidos durante a próxima semana,
quando os indígenas estiverem recompostos no acampamento – por enquanto
estão espalhados, em fuga.
Conforme
o apurado junto a sete mulheres indígenas que fugiram pela mata e
chegaram aos municípios de Amambai e Ponta Porã, durante a correria três
jovens – J.V, 14 anos, M.M, 15 anos, e J.B, 16 anos - teriam sido
baleados, sendo que um encontra-se hospitalizado e os outros dois
desaparecidos.
“A
gente não sabe se os dois desaparecidos tão mortos ou se foram
sequestrados pelos pistoleiros, mas a certeza é de que foram atingidos e
caíram”, disse uma das indígenas. Na fuga, elas eram um grupo de 12
mulheres. Cinco acabaram ficando para trás. Uma mulher e uma criança,
conforme outros indígenas relataram ao Ministério Público federal (MPF),
também são dadas como desaparecidas.
A
Polícia Federal, integrantes da Articulação dos Povos Indígenas do
Brasil (Apib) e conselho Aty Guassu (Grande Assembleia Guarani),
Fundação Nacional do Índio (Funai) e MPF estiveram no acampamento.
Conforme nota, o MPF abriu investigação e na perícia constatou marcas de
sangue que remontam a cena de um corpo sendo arrastado.
Possivelmente
o do cacique Nísio Gomes, 59 anos, executado com tiros de calibre 12.
Depois de morto, o corpo do indígena foi levado pelos pistoleiros –
prática vista em outros massacres cometidos contra os Kaiowá Guarani no
MS. As informações foram passadas logo depois do ataque por um indígena
que correu para pedir socorro. Não há confirmação se além de Nísio
outros indígenas foram mortos – mesmo os dois rapazes baleados e que
estão desaparecidos.
“Estavam
todos de máscaras, com jaquetas escuras. Chegaram ao acampamento e
pediram para todos irem para o chão. Portavam armas calibre 12”, disse um indígena da comunidade que presenciou o ataque e terá sua identidade preservada por motivos de segurança.
Conforme
relato do indígena, o cacique foi executado com tiros na cabeça, no
peito, nos braços e nas pernas. “Chegaram para matar nosso cacique”,
afirmou. O filho de Nísio tentou impedir o assassinato do pai, segundo o
indígena, e se atirou sobre um dos pistoleiros. Bateram no rapaz, mas
ele não desistiu. Só o pararam com um tiro de borracha no peito.
Na
frente do filho, executaram o pai. Cerca de dez indígenas permaneceram
no acampamento. O restante fugiu para o mato e só se sabe de um rapaz
ferido pelos tiros de borracha – disparados contra quem resistiu e
contra quem estava atirado ao chão por ordem dos pistoleiros. Este não é
o primeiro ataque sofrido pela comunidade, composta por cerca de 60
Kaiowá Guarani.
Decisão é de permanecer
Desde
o dia 1º deste mês os indígenas ocupam um pedaço de terra entre as
fazendas Chimarrão, Querência Nativa e Ouro Verde – instaladas em Território Indígena de ocupação tradicional dos Kaiowá.
A
ação dos pistoleiros foi respaldada por cerca de uma dezena de
caminhonetes – marcas Hilux e S-10 nas cores preta, vermelha e verde. Na
caçamba de uma delas o corpo do cacique Nísio foi levado, bem como os
outros sequestrados, estejam mortos ou vivos.
“O
povo continua no acampamento, nós vamos morrer tudo aqui mesmo. Não
vamos sair do nosso tekoha”, afirmou o indígena. Ele disse ainda que a
comunidade deseja enterrar o cacique na terra pela qual a liderança
lutou a vida inteira. “Ele está morto. Não é possível que tenha
sobrevivido com tiros na cabeça e por todo o corpo”, lamentou.
A
comunidade vivia na beira de uma Rodovia Estadual antes da ocupação do
pedaço de terra no tekoha Kaiowá. O acampamento atacado fica na estrada
entre os municípios de Amambai e Ponta Porã, perto da fronteira entre
Brasil e Paraguai.
Conforme
recente publicação do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) sobre a
violência pratica contra os povos indígenas do MS nos últimos oito anos,
no estado está concentrada a maior quantidade de acampamentos indígenas
do País, 31 - há dois anos, em 2009, eram 22.
São mais de 1200 famílias vivendo em condições degradantes à beira de rodovias ou sitiadas em fazendas. Expostas
a violências diversas, as comunidades veem suas crianças sofrerem com a
desnutrição – os casos somam 4 mil nos últimos oito anos - e longe do
território tradicional.
Atualmente,
98% da população originária do estado vivem efetivamente em menos de 75
mil hectares, ou seja, 0,2% do território estadual. Em dados
comparativos, cerca de 70 mil cabeças de gado, das mais de 22,3 milhões
que o estado possui, ocupam área equivalente as que estão efetivamente
na posse dos indígenas hoje.
Sobre o território
Com
relatório em fase de conclusão pela Fundação Nacional do Índio (Funai),
a área ocupada pela comunidade está em processo de identificação desde
2008. Por conta disso, o ataque tem como principal causa o conflito pela
posse do território. A região do ataque fica a meia hora da fronteira
com o Paraguai.
Termo
de Ajustamento de Conduta (TAC) do Ministério Público Federal (MPF),
referente ao processo de demarcação da Terra Indígena, está em execução.
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