
Universidade Federal do Rio
Grande do Norte
Especialização em Ensino de
Sociologia
Cultura e Identidade
Portanto, é a partir de uma
perspectiva interdisciplinar que estudo a conjugalidades entre pessoas do mesmo
sexo, não deixando de considerar os debates dos movimentos feministas e dos
movimentos gays e lésbicos, os quais são imprescindíveis para analisar a questão
em voga que é marcada por demandas judiciais coletivas concomitantemente
a outras intervenções propostas pelos movimentos sociais, e suas articulações com o governo, que culmina
com a realização de duas conferências nacionais de políticas públicas LGBTTT e caminha para a próxima com
muita dificuldade em diversas gestões sejam municipais e mesmo estaduais como e
o caso do RN que esta sendo desafiado a promover conferencias locais e regionais
ate o presente sem sucesso como consta dados do próprio movimento LGBTTT no RN em
referencia, a primeira em 2008 e a segunda em 2011. Também os discursos
proferidos durante a segunda conferência, especialmente em relação ao
reconhecimento das conjugalidades entre pessoas do mesmo sexo como família e as discussões sobre a
necessidade de legislações específicas são importantes para pensar a cerca das semelhanças e
diferenças entre as reivindicações coletivas e a busca pelo reconhecimento ou não dos “casais homo-afetivos”
de mesmo sexo como família.
Ao perceber as discussões em
torno do reconhecimento jurídico e legal da conjugalidade de pessoas do mesmo
sexo, utilizaremos os aportes teóricos da categoria de “gênero”, que busca a
construção de sujeitos e as definições
de gênero que se constituem nos debates judiciais, permitindo observar as
relações existentes entre sujeitos
constituídos socialmente, observando não somente homens e mulheres, “porque o
gênero estabelece interseções com
modalidades “raciais”, classistas, étnicas, sexuais e regionais de identidades discursivamente
constituídas afirma: ”(BUTLER, 2003, p. 20).
Também ao preferir o termo “homoerótico”,
Costa faz uma crítica ao termo homossexualismo, pois essa seria “uma palavra
inventada para descrever pejorativamente a experiência afetivo/sexual de
pessoas do mesmo sexo” (COSTA, 1992).
Para um pequeno panorama sobre os conceitos homossexual e homossexualidade, entendo ser pertinente trazer as discussões
realizadas por Michel Foucault, principalmente a partir da publicação do primeiro volume de “A história
da sexualidade: a vontade de saber”, ocorrida no ano de 1976, que entendo ser imprescindível para se pensar
a temática, já que nos mostra como a sexualidade se tornou uma p reocupação
moral. Foucault explica como “a sodomia era um tipo de ato interdito e o autor
não passava de seu sujeito jurídico” (1988, p. 43) e enfatiza a mudança da
categoria sodomia para a homossexualidade (uma categoria patológica) e o homossexual(um
personagem). Ele mostra como a homossexualidade
passou a ser considerada um desvio, ao longo da história, sendo os homossexuais
diagnosticados por um dos ramos da
medicina, a psiquiatria, como loucos, e, portanto, confinados em hospícios e rejeitados socialmente. Segundo
Didier Eribon, “a percepção social e cultural da homossexualidade transformou-se
profundamente no século XVII” (2008, p. 326). Segundo o psicanalista Jurandir
Freire Costa, “a noção de homossexualidade teve origem no movimento intelectual
derivado das transformações políticos,
econômicas, filosóficas e jurídicas dos fins do século XVIII e começo do século
XIX” (1995, p. 289). A partir desses autores, podemos perceber como a
utilização da categoria homossexual é recente e esteve ligada aos saberes
jurídicos e médicos, estes últimos principalmente a partir do século XIX.
A adoção do termo para designar pessoas
que mantinham relações sexuais com outras do mesmo sexo fez parte de um
movimento geral no sentido de criar categorias e espécies ligadas a
comportamento sexuais, movimento este especialmente impulsionado pelas práticas
legais (Weeks, 1989) e pela categorização médica no século XIX, num processo de
construção da hegemonia do saber médico ocidental sobre outros saberes
(Foucault, 1979) (FACCHINI, 2009, p. 58).
Já o termo homossexual, ligado ao
conceito de movimento social, foi utilizado no Brasil a partir do final da
década de 1970. Segundo Regina Facchini, o movimento homossexual foi um dos
movimentos sociais de maior expressão no país (2005, p. 20). A antropóloga, em
seu trabalho de doutoramento, escolheu a utilização do termo movimento
homossexual, por não ter sido adotada uma única sigla, até aquele momento, que
o representasse como um todo. Ainda segundo a autora, em 1993 ele surge como
Movimento de Gays e Lésbicas MGL, em 1995 é tratado como Gays, Lésbicas e
Travestis GLT e, após 1999, é tratado como Gays, Lésbicas, Bissexuais e
Transgêneros GLBT (FACCHINI, 2005, p. 20). Assim, os diferentes grupos passam a
se distanciar do conceito que lhes agrupava em torno de um único conceito, homossexual, para serem identificados, como
lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros, que engloba
todos estes sujeitos na sigla LGBTTT. Facchini justifica a utilização desse
último termo, pois entende ser ela uma forma de identificação de todos esses grupos
heterogêneos (2005, p. 20). Ana Paula Uziel também enfoca a questão da
substituição do termo homossexual, para quem(...) apesar de toda esta
articulação dentro do movimento, o termo geral “homossexual” vai aos poucos
sendo substituído. Segundo um dos entrevistados de Câmara (2002, p. 55) “o
homossexual não existe, existem práticas homossexuais” (UZIEL, 2006b, p. 212) outro
enfoque é que, mesmo que os grupos utilizem o termo homossexual com cunho aglutinador,
ele acaba por não identificar as pessoas que realizam “práticas homo-afetivas”,
mas não se entendem como “homossexuais”. Jurandir Freire Costa utiliza homoerotismo,
preferindo este termo a homossexualismo, pois entende que este último “além da
conotação preconceituosa do senso comum, está excessivamente comprometido com a
ideologia psiquiátrica que lhe deu origem” (1992, p. 77). Segundo Miriam Grossi,
o psicanalista propõe “que não pensemos na homossexualidade como uma essência,
uma condição imutável de alguns sujeitos, mas como uma possibilidade presente
na maior parte dos indivíduos de desejar alguém de seu próprio sexo” (1998, p.
14). A antropóloga continua afirmando que não é possível falar em “homossexualidade
como uma condição fixa, mas sim como uma possibilidade erótica para muitos indivíduos”
(GROSSI, 1998, p. 14).
Já os movimentos LGBTTT no Brasil
iniciam a partir do surgimento do grupo Somos, em São Paulo, no ano de 1978 e,
se traduzem como um (...) conjunto das associações e entidades, mais ou menos
institucionalizadas, constituídas com o objetivo de defender e garantir
direitos relacionados à livre orientação sexual e/ou reunir, com finalidades
não exclusivamente, mas necessariamente políticas, indivíduos que se reconheçam
a partir de quaisquer identidades sexuais, tomadas como sujeito desse
movimento” (FACCHINI, 2005, p.20). Estes movimentos são caracterizados por sua
diversidade de práticas e concepções políticas, tratando-se, pois de grupos
heterogêneos, mas onde cada um contribui de alguma forma com suas proposições políticas
e intervenções na sociedade. Os movimentos feministas e os LGBTTT, enfocados a
partir de suas propostas de rupturas nas legislações, podem ser analisados como
formas de insurgência dos sujeitos que resistiram
a uma ordem imposta. Resistir, então, se traduz na possibilidade destes
sujeitos vestirem novas roupagens,
diversas daquelas que o poder lhes impunha. O conjunto de reivindicações
feministas a o longo das décadas de 1970
e 1980 permitiu que a Constituição Federal de 1988 incorporasse as principais demandas
feministas e possibilitou a inclusão da idéia de igualdade entre homens e
mulheres. Segundo Câmara (2002, p. 36),
durante o período da Constituinte houve uma demanda de grupos homo-afetivos,
como o Triângulo Rosa, para inclusão no texto constitucional, como na promoção
de políticas públicas, leis e ações que
pudessem ajudar a diminuir a discriminação contra os homo-afetivos, via partidos políticos, organizações da sociedade
civil, OAB, etc. Dessa forma, ainda que o movimento LGBTTT já tivesse abordado
a temática dos direitos, seu significado não teve a importância que adquiriu com
a atuação do grupo neste âmbito, principalmente durante a Constituinte de 1988.
A Câmara destaca a articulação realizada
pelo grupo Triângulo Rosa com o movimento LGBTT, para reivindicar a inclusão da
expressão "orientação sexual" na Constituição Federal. Entretanto, a
expressão não constou do artigo quinto
da constituição que foi promulgada em 1988. A igualdade formal entre homens e mulheres
prevê a incorporação do conceito de equidade, que permite um tratamento
desigual para os desiguais, o que se traduz em políticas públicas e ações afirmativas
diante das desigualdades sociais e historicamente percebidas; entretanto, não
incluiu expressamente a questão da orientação sexual, contemplando as
especificidades de gays e lésbicas. O conceito de equidade está amparado na
teoria da justiça como equidade, de John Rawls, para o qual “a idéia mais
fundamental nesta concepção de justiça é a idéia de sociedade como um sistema equitativo
de cooperação social que se perpetua de uma geração para outra”. (RAWLS, 2003,
p. 07 diante das desigualdades sociais e historicamente percebidas; entretanto,
não incluiu expressamente a questão da orientação sexual, contemplando as
especificidades de gays e lésbicas. Os movimentos sociais, como o movimento LGBTTT
são objeto dos estudos culturais que tematizam os chamados “cidadãos coletivos”
(KRISCHKE, 2006, p. 04), que utilizam diversos meios para expor seus ideais, principalmente propondo legislações
que supram as desigualdades destes sujeitos. Assim:
As relações sociais modernas, com
base na demanda por igualdade da cidadania, e por justiça no reconhecimento e
respeito do direito à diferença (dos pobres, dos trabalhadores, das mulheres,
dos negros, dos indígenas, das crianças,
dos idosos, das minorias éticas, culturais etc.) têm pouco a pouco se difundido
no país, através de greves, conflitos, campanhas, negociações, e mudanças nas legislações
que estabelecem sanções penais aos delitos e preconceitos contrários à justiça (KRISCHKE, 2006, p. 03). Partindo deste ótica
podemos observar é que os movimentos sociais, como o movimento LGBTTT, buscam
dar visibilidade a estes sujeitos, procurando que sejam respeitados os direitos
individuais e coletivos. É partindo destas premissas que os movimentos LGBTTT tornam-se produtores de agenciamentos, buscando o reconhecimento social e jurídico destas
conjugalidades, por meio da inclusão na legislação, e as diversas formas de resistência dos sujeitos/as, os
quais, não tendo reconhecida sua conjugalidade e diante da negação de direitos básicos, tais como o nome social e
a redifinição do conceito plural de família, tendo assim o judiciário como possibilidade de
reconhecimento entre outras formas de resistencia. Não somente a decisão entendida como
histórica, proferida pelo Supremo Tribunal Federal em maio de 2011 que está
iluminando este cenário promissor. Em 2013 estamos diante de outras decisões não
tão menos importantes: a Resolução do Conselho Federal de Medicina, que
possibilitou a reprodução assistida aos casais homo-afetivos e, posteriormente,
a determinação do Conselho Nacional de Justiça de que os cartórios de registro civil no país não
podem se negar a realizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo. A
atualização do nome social na educação e na saúde e como não desde o primeiro projeto de lei de
Marta Suplicy, que tratava apenas de parceria civil, até o atual projeto de lei de autoria do Deputado Jean
Willys que trata do casamento igualitário, há um importante avanço nesta
trajetória
Aproximando as demandas
feministas e as do movimento LGBTTT no Brasil. Mesmo diante de algumas
conquistas de reivindicações feministas, como a igualdade formal entre homens e
mulheres na Constituição Federal de 1988, há a necessidade de constante
vigília, para que discriminações não ocorram e a efetiva igualdade seja implantada,
na prática. Assim como as demandas feministas,LGBTTT, mesmo que existam leis
que permitam e legitimem o casamento e a união estável, possibilitando uma
igualdade formal,
esta não garante que os comportamentos sociais
correspondam ao que dispõe a lei. E seus
meandros tais conjugações sociais como um simples nome ao qual “eu quanto
sujeito social desejo ser chamado (a)”.
Portanto, mesmo que uma lei seja
promulgada no Brasil e esta se transforme num importante instrumento de mudança
social, não garante a efetiva igualdade, como nos alertou Luiz Mello, ao trazer
o exemplo da Espanha. Se o casamento e a união estável não são “o tesouro atrás
do arco-íris”, quando transformados em legislações poderão proporcionar
mudanças significativas no sentido de se obter uma efetiva igualdade, permitindo
que estas pessoas se sintam integralmente inseridas na sociedade, como cidadãs
e cidadãos brasileiros que são As interpretações sobre família através dos
votos dos ministros e ministras se deu de forma bastante diversa. A interpretação do ministro
Marco Aurélio considera a “família como uma construção cultural”, e traz uma
retrospectiva histórica, a partir das legislações que modificaram as relações
familiares como o estatuto da mulher casada e o divórcio. Do mesmo modo, o
ministro Gilmar Mendes também trouxe a legislação do divórcio como importante
para estas mudanças interpretativas a partir de um contexto social e histórico.
Outros ministros se restringiram a apresentar uma interpretação jurídica do
conceito de família e de união estável.
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