Quase metade das mortes de adolescentes de 16 e 17 anos no Brasil em
2013 tiveram como causa o homicídio, segundo o estudo "Mapa da
Violência: Adolescentes de 16 e 17 anos" do Brasil, divulgado nesta
segunda-feira (29) em Brasília.
Foram 3.749 jovens nessa faixa etária vítimas de homicídios, 46% do total de 8.153 óbitos, diz o estudo de autoria do sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz. A média é de 10,3 adolescentes assassinados por dia no país. As outras causas foram acidentes de transporte (13,9%) e suicídios (3,5%).
A projeção é que 3.816 serão mortos em 2015, diz o autor, e a metade dessas mortes seja por homicídio.
Esse tipo de causa externa (mortes que não são de causas naturais) aumentou 496% em relação a 1980, quando o homicídio representava apenas 9,7% do total de mortes.
Em comparação às outras causas, nesse mesmo período os suicídios aumentaram 45,5% e os acidentes de transporte cresceram 38,3%.
Na faixa de 16 e 17 anos, a taxa de mortalidade ficou em 54,1 homicídios por 100 mil adolescentes em 2013, um aumento de 2,7% em relação a 2012 e de 38,3% na década.
O Brasil ocupa o 3º lugar em relação a 85 países no ranking de mortes de adolescentes de 15 a 19 anos, perdendo apenas para México e El Salvador. São 54,9 mortes a cada 100 mil jovens.
Perfil
A maioria das vítimas é do sexo masculino (93%) com quatro até sete anos de estudo (62,1%). Proporcionalmente, morreram quase três vezes mais negros do que brancos.
O principal instrumento utilizado nas agressões foi a arma de fogo, presente em 81,9% dos homicídios de adolescentes de 16 anos e em 84,1% dos de 17 anos. Em seguida estão instrumentos cortantes, como facas e estiletes, com 10%.
Regiões
Os maiores índices de violência estão no Nordeste, com uma taxa de 73,3 jovens mortos a cada 100 mil, e Centro-Oeste, com 65,3.
No Rio Grande do Norte, Ceará e Roraima, as taxas mais que quadruplicam na década. São Paulo, Pernambuco e Rio de Janeiro tiveram redução.
As maiores taxas de homicídio entre adolescentes de 16 e 17 anos nas cidades estão na Bahia: Simões Filho, Lauro de Freitas e Porto Seguro.
No Maranhão está o maior índice de vitimização de negros: 1.188%. Isso siginifica que, proporcionalmente, morrem 13 negros por cada branco naquele estado. Em seguida, aparecem a Bahia, com 12 negros por cada branco; Sergipe e Alagoas, com taxas de nove negros por cada branco.
Os dados utilizados estão no Sistema de Informações de Mortalidade (SIM) da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), do Ministério da Saúde.
Dados são do instituto e de órgão da Secretaria de Direitos Humanos.
Jovens internados em unidade socioeducativa no DF
(Foto: Hmenon Oliveira/Agência Brasília)
O Brasil tinha 23,1 mil adolescentes privados de liberdade em 2013, segundo dados divulgados nesta terça-feira (16) em Brasília
pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicas (Ipea). Os dados são do
Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), órgão ligado à
Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, e do Ipea.
(Correção: ao ser publicada, esta reportagem errou ao informar que 60% dos adolescentes infratores eram negros e 51% não frequentavam a escola em 2013. Esses dados, na verdade, são referentes a 2003. Também estava errada a informação de que 90% dos jovens infratores são homens; o percentual correto é 95%. A informação foi corrigida às 13h34.)
O levantamento aponta ainda que 95% dos adolescentes infratores cumprindo medida socioeducativa são do sexo masculino e mais da metade das infrações registradas foram cometidas por jovens entre 16 e 18 anos.
De acordo com o levantamento, os estados com maior número de adolescentes cumprindo medidas socioeducativas em regime fechado em 2012, ano com dados mais recentes nesse tópico, eram São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco e Ceará.
A região Sul possui a maior porcentagem de adolescentes internados por homicídio e latrocínio – 451 jovens, ou 20% do total. O Nordeste possui o maior número absoluto de adolescentes reincidentes, que cumprem medidas pelos mesmos delitos praticados – 869 (17% do total).
Mais da metade dos adolescentes internados no Norte (51%) e Centro-Oeste (52%) cometeram atos como roubo e furto. As duas regiões tinham as menores taxas de delitos relacionados ao tráfico de drogas – 7% e 12%, respectivamente.
Para a técnica em Planejamento e Pesquisa do Ipea, Enid Rocha, o número de adolescentes internados poderia ser bem menor. "De 23 mil adolescentes privados de liberdade, apenas 8,7% são por homicídio, e existe uma orientação do ECA de que a privação de liberdade deve ser aplicada apenas em ato de violência de alta gravidade."
“Quando vamos olhar, apenas 3,2 mil meninos estão privados de liberdade por delitos relacionados a homicídios, latrocínios, estupro e lesão corporal. O restante está privado de liberdade por atos como furto, tráfico de drogas, que não justificaria a severidade da medida", disse.
“Não sabemos o que levou o Judiciário a aplicar essas medidas, mas reconhecemos que há dificuldades. (...) Nós temos um problema no país que não conhecemos verdadeiramente esses meninos e meninas então há necessidade de o país em investir em dados", declarou.
Técnicos do Ipea durante apresentação de dados sobre perfil dos jovens infratores no Brasil (Foto: Isabella Formiga/G1)
De acordo com o Ipea, um relatório elaborado pela Comissão de Infância e
Juventude do Conselho Nacional do Ministério Público apontava
superlotação nas unidades de internação em 16 estados – em alguns deles,
maior que 300%.
O levantamento aponta ainda que a maior parte dos centros de internação não separa internos provisórios dos definitivos nem por idade, tipo físico ou por infração cometida, como determina o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Fugas e mortes
Entre março de 2012 e março de 2013, foram registradas as fugas de 1.560 adolescentes que cumpriam medidas socioeducativas no país, mostra o estudo. Os dados do Sinase apontam que neste período 30 adolescentes morreram.
De acordo com ela, em São Paulo, o número de jovens que praticam crimes é bem menor que o número de adultos. De cada 100 pessoas privadas de liberdade 87 são adultos e 13 são adolescentes. Segundo ela, dos 9.260 adolescentes privados de liberdade, 95% são homens e 5%, mulheres. Entre os delitos cometidos por adolescentes, o roubo aparece em primeiro lugar (43%), seguido do tráfico (39%), crimes como o homicídio, latrocínio e estupro respondem por cerca de 1% dos crimes.
“Depois de 10 anos à frente da Fundação Casa, convivendo diariamente com adolescentes [infratores] e estudando cada vez mais o assunto, o que eu posso frisar é que a redução [da maioridade] não vai levar à diminuição da prática de atos infracional por adolescentes. O consenso de que reduzir a maioridade vai reduzir a criminalidade não é verdadeiro”, complementou Berenice durante audiência pública na Câmara dos Deputados para debater o tema. “Me chama a atenção o número de crimes hediondos. Temos 268 respondendo por crimes hediondos, não chega a 3% dos que praticaram homicídio, estupro e outros", ressaltou.
A redução da maioridade tem gerado muitos debates, às vezes com posições extremadas. Amanhã (17), a comissão mista da Câmara dos Deputados poderá votar o relatório do deputado Laerte Bessa (PR-DF) a uma proposta de emenda à Constituição (PEC 171/93) que reduz de 18 para 16 anos a maioridade penal.
Segundo o juiz da Infância e Juventude de Porto Alegre (RS), João Batista Costa Saraiva, caso a redução seja aprovada, cerca de 60 mil adolescentes serão lançados em presídios. Saraiva criticou a forma como o debate vem sendo conduzido sem dados precisos. “É lamentável que se pretenda vender para a sociedade uma expectativa de segurança a partir da redução. Isso não vai mudar em nada. Eu não acho razoável que um debate dessa natureza seja conduzido de forma tão irresponsável, através de um achismo, sem dados estatísticos claros”, argumentou.
Segundo Saraiva, são falas as argumentações de que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) promova a impunidade de adolescentes que cometem atos infracionais, e defendeu alterações no estatuto como o aumento do tempo máximo de internação, que hoje é de três anos. “Não estou dizendo que o ECA seja intocável, ou que não tenha defeitos, mas ele precisa ser aprimorado, de forma que respeite os compromissos do Brasil com suas crianças e adolescentes, com a comunidade internacional", sentenciou.
Na manhã desta terça-feira, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse que o governo também defende um tempo maior de internação para jovens que praticarem crimes hediondos, com violência ou grave ameaça, como alternativa à redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. Cardozo disse que a redução da maioridade penal é um equívoco, e pode provocar caos no sistema penitenciário, que tem déficit de 300 mil vagas.
Foram 3.749 jovens nessa faixa etária vítimas de homicídios, 46% do total de 8.153 óbitos, diz o estudo de autoria do sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz. A média é de 10,3 adolescentes assassinados por dia no país. As outras causas foram acidentes de transporte (13,9%) e suicídios (3,5%).
Taxa de homicídio (por 100 mil) de adolescentes de 16 e 17 anos por estado |
|
---|---|
AL | 147 |
ES | 140,6 |
CE | 108 |
RN | 98,1 |
DF | 83,3 |
GO | 83,1 |
PB | 80,2 |
SE | 78 |
BA | 73,5 |
AP | 71 |
RJ | 62,5 |
PA | 62,1 |
PE | 56,1 |
MT | 55,4 |
BR | 54,1 |
AM | 51,9 |
MG | 51,2 |
PR | 45,4 |
MA | 39,3 |
RR | 34,8 |
RS | 32,2 |
MS | 32 |
PI | 31,8 |
AC | 27,7 |
RO | 23,5 |
SP | 21,3 |
SC | 17,3 |
TO | 13,8 |
Fonte: Mapa da Violência: Adolescentes de 16 e 17 anos do Brasil/ Dados de 2013 |
Esse tipo de causa externa (mortes que não são de causas naturais) aumentou 496% em relação a 1980, quando o homicídio representava apenas 9,7% do total de mortes.
Em comparação às outras causas, nesse mesmo período os suicídios aumentaram 45,5% e os acidentes de transporte cresceram 38,3%.
Na faixa de 16 e 17 anos, a taxa de mortalidade ficou em 54,1 homicídios por 100 mil adolescentes em 2013, um aumento de 2,7% em relação a 2012 e de 38,3% na década.
O Brasil ocupa o 3º lugar em relação a 85 países no ranking de mortes de adolescentes de 15 a 19 anos, perdendo apenas para México e El Salvador. São 54,9 mortes a cada 100 mil jovens.
Perfil
A maioria das vítimas é do sexo masculino (93%) com quatro até sete anos de estudo (62,1%). Proporcionalmente, morreram quase três vezes mais negros do que brancos.
O principal instrumento utilizado nas agressões foi a arma de fogo, presente em 81,9% dos homicídios de adolescentes de 16 anos e em 84,1% dos de 17 anos. Em seguida estão instrumentos cortantes, como facas e estiletes, com 10%.
Regiões
Os maiores índices de violência estão no Nordeste, com uma taxa de 73,3 jovens mortos a cada 100 mil, e Centro-Oeste, com 65,3.
saiba mais
Nos estados, lideram esse ranking Alagoas, Espírito Santo e Ceará. As menores taxas estão em Tocantins, Santa Catarina e São Paulo.No Rio Grande do Norte, Ceará e Roraima, as taxas mais que quadruplicam na década. São Paulo, Pernambuco e Rio de Janeiro tiveram redução.
As maiores taxas de homicídio entre adolescentes de 16 e 17 anos nas cidades estão na Bahia: Simões Filho, Lauro de Freitas e Porto Seguro.
No Maranhão está o maior índice de vitimização de negros: 1.188%. Isso siginifica que, proporcionalmente, morrem 13 negros por cada branco naquele estado. Em seguida, aparecem a Bahia, com 12 negros por cada branco; Sergipe e Alagoas, com taxas de nove negros por cada branco.
Os dados utilizados estão no Sistema de Informações de Mortalidade (SIM) da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), do Ministério da Saúde.
PPP de cadeia
Quanto mais presos, maior o lucro
Na primeira penitenciária privada desde a licitação, o Estado garante
90% de lotação mínima e seleciona os presos para facilitar o sucesso do
projeto. Da Agência Pública
por Agência Pública
—
publicado
28/05/2014 05h35,
última modificação
28/05/2014 16h01
Peu Robles
Pátio da penitenciária de Ribeirão de Neves, em Minas Gerais
Por Paula Sacchetta
Em janeiro do ano passado (2013), assistimos ao anúncio da inauguração da “primeira penitenciária privada do país”, em Ribeirão das Neves, região metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais. Porém, prisões “terceirizadas” já existem em pelo menos outras 22 localidades, a diferença é que esta de Ribeirão das Neves é uma PPP (parceria público-privada) desde sua licitação e projeto, e as outras eram unidades públicas que em algum momento passaram para as mãos de uma administração privada. Na prática, o modelo de Ribeirão das Neves cria penitenciárias privadas de fato, nos outros casos, a gestão ou determinados serviços são terceirizados, como a saúde dos presos e a alimentação.
Hoje existem no mundo aproximadamente 200 presídios privados, sendo metade deles nos Estados Unidos. O modelo começou a ser implantado naquele país ainda nos anos 1980, no governo Ronald Reagan, seguindo a lógica de aumentar o encarceramento e reduzir os custos, e hoje atende a 7% da população carcerária. O modelo também é bastante difundido na Inglaterra – lá implantado por Margareth Thatcher – e foi fonte de inspiração da PPP de Minas, segundo o governador do estado Antônio Anastasia. Em Ribeirão das Neves o contrato da PPP foi assinado em 2009, na gestão do então governador Aécio Neves.
O slogan do complexo penitenciário de Ribeirão das Neves é “menor custo e maior eficiência”, mas especialistas questionam sobretudo o que é tido como “eficiência”. Para Robson Sávio, coordenador do Núcleo de Estudos Sociopolíticos (Nesp) da PUC-Minas e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, essa eficiência pode caracterizar um aumento das prisões ou uma ressocialização de fato do preso. E ele acredita que a privatização tende para o primeiro caso. Entre as vantagens anunciadas está, também, a melhoria na qualidade de atendimento ao preso e na infra-estrutura dos presídios.
Bruno Shimizu e Patrick Lemos Cacicedo, coordenadores do Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria Pública de São Paulo questionam a legalidade do modelo. Para Bruno “do ponto de vista da Constituição Federal, a privatização das penitenciárias é um excrescência”, totalmente inconstitucional, afirma, já que o poder punitivo do Estado não é delegável. “Acontece que o que tem impulsionado isso é um argumento político e muito bem construído. Primeiro se sucateou o sistema penitenciário durante muito tempo, como foi feito durante todo um período de privatizações, (…) para que então se atingisse uma argumentação que justificasse que esses serviços fossem entregues à iniciativa privada”, completa.
Laurindo Minhoto, professor de sociologia na USP e autor de Privatização de presídios e criminalidade, afirma que o Estado está delegando sua função mais primitiva, seu poder punitivo e o monopólio da violência. O Estado, sucateado e sobretudo saturado, assume sua ineficiência e transfere sua função mais básica para empresas que podem realizar o serviço de forma mais “prática”. E essa forma se dá através da obtenção de lucro.
Patrick afirma que o maior perigo desse modelo é o encarceramento em massa. Em um país como o Brasil, com mais de 550 mil presos, quarto lugar no ranking dos países com maior população carcerária do mundo e que em 20 anos (1992-2012) aumentou essa população em 380%, segundo dados do DEPEN, só tende a encarcerar mais e mais. Nos Estados Unidos, explica, o que ocorreu com a privatização desse setor foi um lobby fortíssimo pelo endurecimento das penas e uma repressão policial ainda mais ostensiva. Ou seja, começou a se prender mais e o tempo de permanência na prisão só aumentou. Hoje, as penitenciárias privadas nos EUA são um negócio bilionário que apenas no ano de 2005 movimentou quase 37 bilhões de dólares.
Como os presídios lucram
Nos documentos da PPP de Neves disponíveis no site do governo de Minas Gerais, fala-se inclusive no “retorno ao investidor”, afinal, são empresas que passaram a cuidar do preso e empresas buscam o lucro. Mas como se dá esse retorno? Como se dá esse lucro?
Um preso “custa” aproximadamente R$ 1.300,00 por mês, podendo variar até R$ 1.700,00, conforme o estado, numa penitenciária pública. Na PPP de Neves, o consórcio de empresas recebe do governo estadual R$ 2.700,00 reais por preso por mês e tem a concessão do presídio por 27 anos, prorrogáveis por 35. Hamilton Mitre, diretor de operações do Gestores Prisionais Associados (GPA), o consórcio de empresas que ganhou a licitação, explica que o pagamento do investimento inicial na construção do presídio se dá gradualmente, dissolvido ao longo dos anos no repasse do estado. E o lucro também. Mitre insiste que com o investimento de R$ 280 milhões – total gasto até agora – na construção do complexo esse “payback”, ou retorno financeiro, só vem depois de alguns anos de funcionamento ou “pleno vôo”, como gosta de dizer.
Especialistas, porém, afirmam que o lucro se dá sobretudo no corte de gastos nas unidades. José de Jesus Filho, assessor jurídico da Pastoral Carcerária, explica: “entraram as empresas ligadas às privatizações das estradas, porque elas são capazes de reduzir custos onde o Estado não reduzia. Então ela [a empresa] ganha por aí e ganha muito mais, pois além de reduzir custos, percebeu, no sistema prisional, uma possibilidade de transformar o preso em fonte de lucro”.
Para Shimizu, em um país como o Brasil, “que tem uma das mais altas cargas tributárias do mundo”, não faz sentido cortar os gastos da população que é “justamente a mais vulnerável e a que menos goza de serviços públicos”. No complexo de Neves, os presos têm 3 minutos para tomar banho e os que trabalham, 3 minutos e meio. Detentos denunciaram que a água de dentro das celas chega a ser cortada durante algumas horas do dia.
O cúmulo da privatização
Outra crítica comum entre os entrevistados foi o fato de o próprio GPA oferecer assistência jurídica aos detentos. No marketing do complexo, essa é uma das bandeiras: “assistência médica, odontológica e jurídica”. Para Patrick, a função é constitucionalmente reservada à Defensoria, que presta assistência gratuita a pessoas que não podem pagar um advogado de confiança. “Diante de uma situação de tortura ou de violação de direitos, essa pessoa vai buscar um advogado contratado pela empresa A para demandar contra a empresa A. Evidentemente isso tudo está arquitetado de uma forma muito perversa”, alerta.
Segundo ele, interessa ao consórcio que, além de haver cada dia mais presos, os que já estão lá sejam mantidos por mais tempo. Uma das cláusula do contrato da PPP de Neves estabelece como uma das “obrigações do poder público” a garantia “de demanda mínima de 90% da capacidade do complexo penal, durante o contrato”. Ou seja, durante os 27 anos do contrato pelo menos 90% das 3336 vagas devem estar sempre ocupadas. A lógica é a seguinte: se o país mudar muito em três décadas, parar de encarcerar e tiver cada dia menos presos, pessoas terão de ser presas para cumprir a cota estabelecida entre o Estado e seu parceiro privado. “Dentro de uma lógica da cidadania, você devia pensar sempre na possibilidade de se ter menos presos e o que acontece ali é exatamente o contrário”, afirma Robson Sávio.
Para ele, “na verdade não se está preocupado com o que vai acontecer depois, se está preocupado com a manutenção do sistema funcionando, e para ele funcionar tem que ter 90% de lotação, porque se não ele não dá lucro”.
Para garantir a lei, a ordem e a imagem
Na foto, o complexo de Neves é realmente diferente das penitenciárias públicas. É limpo, organizado e altamente automatizado, repleto de câmeras, portões que são abertos por torres de controle, etc, etc, etc. Mas que tipo de preso vai pra lá? Hamilton Mitre, diretor do GPA afirma que “não dá pra falar que o Estado coloca os presos ali de forma a privilegiar o projeto”.
Sala de controle do presídio privado: aqui não entra quem for do PCC. (Foto: Peu Robles)
No entanto, Murilo Andrade de Oliveira, subsecretário de Administração Penitenciária do Estado de Minas, diz exatamente o contrário: “nós estabelecemos inicialmente o critério de que [pode ir para a PPP] qualquer preso, podemos dizer assim, do regime fechado, salvo preso de facção criminosa – que a gente não encaminha pra cá – e preso que tem crimes contra os costumes, estupradores. No nosso entendimento esse preso iria atrapalhar o projeto”.
Na visão dos outros entrevistados, a manipulação do perfil do preso pode ser uma maneira de camuflar os resultados da privatização dos presídios. “É muito fácil fazer desses presídios uma janela de visibilidade: ‘olha só como o presídio privado funciona’, claro que funciona, há todo um corte e uma seleção anterior”, diz Bruno Shimizu.
Robson Sávio explica que presos considerados de “maior periculosidade”, “pior comportamento” ou que não querem trabalhar ou estudar são mais difíceis de ressocializar, ou seja, exigiriam investimentos maiores nesse sentido. Na lógica do lucro, portanto, eles iriam mesmo atrapalhar o projeto.
Se há rebeliões, fugas ou qualquer manifestação do tipo, o consórcio é multado e perde parte do repassa de verba. Por isso principalmente o interesse em presos de “bom comportamento”. O subsecretário Murilo afirma ainda que os que não quiserem trabalhar nem estudar podem ser “devolvidos” às penitenciárias públicas: “o ideal seria ter 100% de presos trabalhando, esse é nosso entendimento. Agora, tem presos que realmente não querem estudar, não querem trabalhar, e se for o caso, posteriormente, a gente possa tirá-los (sic), colocar outros que queiram trabalhar e estudar porque a intenção nossa é ter essas 3336 vagas aqui preenchidas com pessoas que trabalhem e estudem”.
Hoje, na PPP de Ribeirão das Neves ainda não são todos os presos que trabalham e estudam e os que têm essa condição se sentem privilegiados em relação aos outros. A reportagem só pôde entrevistar presos no trabalho ou durante as aulas, não foi permitido falar com outros presos, escolhidos aleatoriamente. Foram mostradas todas as instalações da unidade 2 do complexo, tais como enfermaria, oficinas de trabalho, biblioteca e salas de aula, mas não pudemos conversar com presos que não trabalham nem estudam e muito menos andar pelos pavilhões, chamados, no eufemismo do luxo de Neves, de “vivências”.
O trabalho do preso: 54% mais barato
O Estado e o consórcio buscam empresas que se interessem com o trabalho do preso. As empresas do próprio consórcio não podem contratar o trabalho deles a não ser para cuidar das próprias instalações da unidade, como elétrica e limpeza. Então o lucro do consórcio não vem diretamente do trabalho dos presos, mas sim do repasse mensal do estado.
Mas a que empresa não interessaria o trabalho de um preso? As condições de trabalho não são regidas pela CLT, mas sim pela Lei de Execução Penal (LEP), de 1984. Se a Constituição Federal de 1988 diz que nenhum trabalhador pode ganhar menos de um salário mínimo, a LEP afirma que os presos podem ganhar ¾ de um salário mínimo, sem benefícios. Um preso sai até 54% mais barato do que um trabalhador não preso assalariado e com registro em carteira.
O professor Laurindo Minhoto explica: “o lucro que as empresas auferem com esta onda de privatização não vem tanto do trabalho prisional, ou seja, da exploração da mão de obra cativa, mas vem do fato de que os presos se tornaram uma espécie de consumidores cativos dos produtos vendidos pela indústria da segurança e da infra-estrutura necessária à construção de complexos penitenciários”.
Helbert Pitorra, coordenador de atendimento do GPA, na prática, quem coordena o trabalho dos presos, orgulha-se que o complexo está virando um “pólo de EPIs” (equipamentos de proteção individual), ou seja, um pólo na fabricação de equipamentos de segurança. “Eles fabricam dentro da unidade prisional sirenes, alarmes, vários circuitos de segurança, (…) calçados de segurança como coturnos e botas de proteção (…), além de uniformes e artigos militares”.
O que é produzido ali dentro, em preços certamente mais competitivos no mercado alimenta a própria infra-estrutura da unidade. A capa dos coletes à prova de balas que os funcionários do GPA usam é fabricada ali dentro mesmo, a módicos preços, realizados por um preso que custa menos da metade de um trabalhador comum a seu empregador.
Em abril deste ano, o Governo de Minas Gerais foi condenado por terceirização ilícita no presídio de Neves. A Justiça do Trabalho confirmou a ação civil pública do Ministério Público do Trabalho e anulou várias das contratações feitas pelo GPA.
“Entre os postos de trabalho terceirizados estão atividades relacionadas com custódia, guarda, assistência material, jurídica e à saúde, uma afronta à Lei 11.078/04 que classifica como indelegável o poder de polícia e também a outros dispositivos legais. Além de ser uma medida extremamente onerosa para os cofres públicos, poderá dar azo a abusos sem precedentes”, disse o procurador que atuou no caso, Geraldo Emediato de Souza, ao portal mineiro Hoje em dia.
Panorama final
Como na maioria das penitenciárias, as visitas do Complexo passam por revista vexatória. A., mulher de um detento que preferiu não se identificar, entregou à reportagem uma carta dos presos e explicou como é feita a revista: “temos que tirar a roupa toda e fazer posição ginecológica, agachamos três vezes ou mais, de frente e de costas, temos que tapar a respiração e fazer força. Depois ainda sentamos num banco que detecta metais”. Na mesma carta entregue por A., os presos afirmam que os diretores do presídio já têm seus “beneficiados”, que sempre falam “bem da unidade” à imprensa, e são, invariavelmente, os que trabalham ou estudam.
Na carta, eles ainda afirmam que na unidade já há presos com penas vencidas que não foram soltos ainda. Fontes que também não quiseram se identificar insistem que o consórcio da PPP já “manda” na vara de execuções penais de Ribeirão das Neves.
José de Jesus filho, da Pastoral Carcerária, não vê explicação para a privatização de presídios que não a “corrupção”.Tem seus motivos. Em maio de 2013, a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e a Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô) foram alvo de ações por corrupção e má utilização de recursos públicos. Na ação da CPTM foi citado o ex-diretor, Telmo Giolito Porto, hoje à frente do consórcio da PPP de Ribeirão das Neves, assim como a empresa Tejofran de Saneamento e Serviços Gerais LTDA., que faz parte do mesmo consórcio.
Nesse sentido, Robson Sávio alerta: “será que o estado quando usa de tanta propaganda para falar de um modelo privado ele não se coloca na condição de sócio-interesseiro nos resultados e, portanto, se ele é sócio-interesseiro ele também pode maquiar dados e esconder resultados, já que tudo é dado e planilha? Esse sistema ainda tem muita coisa que precisa ser mais transparente e melhor explicada”.
Pelo Brasil
O modelo mineiro de PPP já inspirou projetos semelhantes no Rio Grande do Sul, em Pernambuco e no Distrito Federal. As licitações já aconteceram ou estão abertas e, em breve, as penitenciárias começarão a ser construídas. O governo do Estado de São Paulo e a Secretaria de Administração Penitenciária também pretendem lançar em breve um edital para a construção de um grande complexo no Estado, com capacidade para 10.500 presos. O governador Geraldo Alckmin já fez consultas públicas e empresas já se mostraram interessadas no projeto.
No Ceará, uma decisão judicial obrigou à iniciativa privada devolver a gestão de penitenciárias para o Governo do estado. No Paraná, o próprio Governo decidiu retomar a administração de uma série de penitenciárias, após avaliar duas questões: a jurídica e a financeira.
No Brasil, país do “bandido bom é bandido morto”, da “bancada da bala” e onde presos não têm direitos simplesmente por estarem presos, a privatização também assusta do ponto de vista da garantia dos direitos humanos dos presos. “Será que num sistema que a sociedade nem quer saber e não está preocupada, como é o prisional, haverá fiscalização e transparência suficiente? Ou será que agora estamos criando a indústria do preso brasileiro?”, pergunta Sávio.
Os entrevistados dão um outro alerta: nesse primeiro momento, vai se investir muito em marketing para que modelos como o de Neves sejam replicados Brasil afora. Hamilton Mitre diz que a unidade será usada como um “cartão de visitas” e fontes afirmam que o modelo de privatização de presídios será plataforma de campanha de Aécio Neves, candidato à presidência nas eleições do fim deste ano.
Para Minhoto, a partir do momento em que você enraíza um interesse econômico e lucrativo na gestão do sistema penitenciário, “o estado cai numa armadilha de muitas vezes ter que abrir mão da melhor opção de política em troca da necessidade de garantir um retorno ao investimento que a iniciativa privada fez na área”, diz. E Bruno Shimizu completa “e isso pode fazer com que a gente crie um monstro do qual a gente talvez não vá mais conseguir se livrar”.
“Para quem investe em determinado produto, no caso o produto humano, o preso, será interessante ter cada vez mais presos. Ou seja, segue-se a mesma lógica do encarceramento em massa. A mesma lógica que gerou o caos, que justificou a privatização dos presídios”, arremata Patrick.
Para entender: dados e números
Brasil
- Existem no Brasil aproximadamente 550 mil presos.
- São aproximadamente 340 mil vagas no sistema prisional.
- O Brasil está em 4o lugar no ranking dos países com maior população carcerária no mundo, atrás de EUA, China e Rússia.
- Entre 1992 e 2012 o Brasil aumentou sua população carcerária 380%.
- Empresas dividem a gestão de penitenciárias com o poder público em pelo menos 22 presídios de sete estados: Santa Catarina, Minas Gerais, Espírito Santo, Tocantins, Bahia, Alagoas e Amazonas.
Minas Gerais- Em 2003 o Estado de Minas tinha aproximadamente 23 mil presos.- Em 10 anos essa população mais do que duplicou: hoje são 50 mil presos. - Em 2003 eram 30 unidades prisionais no Estado, hoje são mais de 100. - Em 2011 o Estado de Minas já gastava aproximadamente um bilhão de reais por ano com o sistema penitenciário.
O complexo de Ribeirão das Neves
- O consórcio Gestores Prisionais Associados (GPA), que ganhou a licitação do complexo penitenciário de Ribeirão das Neves é formado por cinco empresas, são elas:
CCI Construções S/A
Construtora Augusto Velloso S/A
Empresa Tejofran de Saneamento e Serviços LTDA
N. F. Motta Construções e Comércio
Instituto Nacional de Administração Penitenciária (INAP)
- Em 18 de janeiro de 2013 começaram a ser transferidos os primeiros presos para o Complexo Penitenciário de Ribeirão das Neves.
- A inauguração aconteceu no dia 28 de janeiro de 2013, com uma ala já ocupada por 75 presos. - Hoje (maio de 2014) estão funcionando duas das cinco unidades do complexo, cada uma com 672 presos.
- A capacidade do complexo é de 3336 vagas.
- O consórcio de empresas tem 27 anos da concessão do complexo, sendo dois para construção e 25 para operação. - Já foram gastos 280 milhões de reais na construção do complexo até agora. O GPA estima que no total serão gastos 380 milhões.
- O Estado repassa R$2.700 por preso mensalmente; nas penitenciárias públicas o custo é de R$ 1.300,00 a R$ 1.700,00 por mê - As celas têm capacidade máxima para quatro presos. - Detalhes sobre a PPP de Ribeirão das Neves e documentos podem ser acessados neste site.
Em janeiro do ano passado (2013), assistimos ao anúncio da inauguração da “primeira penitenciária privada do país”, em Ribeirão das Neves, região metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais. Porém, prisões “terceirizadas” já existem em pelo menos outras 22 localidades, a diferença é que esta de Ribeirão das Neves é uma PPP (parceria público-privada) desde sua licitação e projeto, e as outras eram unidades públicas que em algum momento passaram para as mãos de uma administração privada. Na prática, o modelo de Ribeirão das Neves cria penitenciárias privadas de fato, nos outros casos, a gestão ou determinados serviços são terceirizados, como a saúde dos presos e a alimentação.
Hoje existem no mundo aproximadamente 200 presídios privados, sendo metade deles nos Estados Unidos. O modelo começou a ser implantado naquele país ainda nos anos 1980, no governo Ronald Reagan, seguindo a lógica de aumentar o encarceramento e reduzir os custos, e hoje atende a 7% da população carcerária. O modelo também é bastante difundido na Inglaterra – lá implantado por Margareth Thatcher – e foi fonte de inspiração da PPP de Minas, segundo o governador do estado Antônio Anastasia. Em Ribeirão das Neves o contrato da PPP foi assinado em 2009, na gestão do então governador Aécio Neves.
O slogan do complexo penitenciário de Ribeirão das Neves é “menor custo e maior eficiência”, mas especialistas questionam sobretudo o que é tido como “eficiência”. Para Robson Sávio, coordenador do Núcleo de Estudos Sociopolíticos (Nesp) da PUC-Minas e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, essa eficiência pode caracterizar um aumento das prisões ou uma ressocialização de fato do preso. E ele acredita que a privatização tende para o primeiro caso. Entre as vantagens anunciadas está, também, a melhoria na qualidade de atendimento ao preso e na infra-estrutura dos presídios.
Bruno Shimizu e Patrick Lemos Cacicedo, coordenadores do Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria Pública de São Paulo questionam a legalidade do modelo. Para Bruno “do ponto de vista da Constituição Federal, a privatização das penitenciárias é um excrescência”, totalmente inconstitucional, afirma, já que o poder punitivo do Estado não é delegável. “Acontece que o que tem impulsionado isso é um argumento político e muito bem construído. Primeiro se sucateou o sistema penitenciário durante muito tempo, como foi feito durante todo um período de privatizações, (…) para que então se atingisse uma argumentação que justificasse que esses serviços fossem entregues à iniciativa privada”, completa.
Laurindo Minhoto, professor de sociologia na USP e autor de Privatização de presídios e criminalidade, afirma que o Estado está delegando sua função mais primitiva, seu poder punitivo e o monopólio da violência. O Estado, sucateado e sobretudo saturado, assume sua ineficiência e transfere sua função mais básica para empresas que podem realizar o serviço de forma mais “prática”. E essa forma se dá através da obtenção de lucro.
Patrick afirma que o maior perigo desse modelo é o encarceramento em massa. Em um país como o Brasil, com mais de 550 mil presos, quarto lugar no ranking dos países com maior população carcerária do mundo e que em 20 anos (1992-2012) aumentou essa população em 380%, segundo dados do DEPEN, só tende a encarcerar mais e mais. Nos Estados Unidos, explica, o que ocorreu com a privatização desse setor foi um lobby fortíssimo pelo endurecimento das penas e uma repressão policial ainda mais ostensiva. Ou seja, começou a se prender mais e o tempo de permanência na prisão só aumentou. Hoje, as penitenciárias privadas nos EUA são um negócio bilionário que apenas no ano de 2005 movimentou quase 37 bilhões de dólares.
Como os presídios lucram
Nos documentos da PPP de Neves disponíveis no site do governo de Minas Gerais, fala-se inclusive no “retorno ao investidor”, afinal, são empresas que passaram a cuidar do preso e empresas buscam o lucro. Mas como se dá esse retorno? Como se dá esse lucro?
Um preso “custa” aproximadamente R$ 1.300,00 por mês, podendo variar até R$ 1.700,00, conforme o estado, numa penitenciária pública. Na PPP de Neves, o consórcio de empresas recebe do governo estadual R$ 2.700,00 reais por preso por mês e tem a concessão do presídio por 27 anos, prorrogáveis por 35. Hamilton Mitre, diretor de operações do Gestores Prisionais Associados (GPA), o consórcio de empresas que ganhou a licitação, explica que o pagamento do investimento inicial na construção do presídio se dá gradualmente, dissolvido ao longo dos anos no repasse do estado. E o lucro também. Mitre insiste que com o investimento de R$ 280 milhões – total gasto até agora – na construção do complexo esse “payback”, ou retorno financeiro, só vem depois de alguns anos de funcionamento ou “pleno vôo”, como gosta de dizer.
Especialistas, porém, afirmam que o lucro se dá sobretudo no corte de gastos nas unidades. José de Jesus Filho, assessor jurídico da Pastoral Carcerária, explica: “entraram as empresas ligadas às privatizações das estradas, porque elas são capazes de reduzir custos onde o Estado não reduzia. Então ela [a empresa] ganha por aí e ganha muito mais, pois além de reduzir custos, percebeu, no sistema prisional, uma possibilidade de transformar o preso em fonte de lucro”.
Para Shimizu, em um país como o Brasil, “que tem uma das mais altas cargas tributárias do mundo”, não faz sentido cortar os gastos da população que é “justamente a mais vulnerável e a que menos goza de serviços públicos”. No complexo de Neves, os presos têm 3 minutos para tomar banho e os que trabalham, 3 minutos e meio. Detentos denunciaram que a água de dentro das celas chega a ser cortada durante algumas horas do dia.
O cúmulo da privatização
Outra crítica comum entre os entrevistados foi o fato de o próprio GPA oferecer assistência jurídica aos detentos. No marketing do complexo, essa é uma das bandeiras: “assistência médica, odontológica e jurídica”. Para Patrick, a função é constitucionalmente reservada à Defensoria, que presta assistência gratuita a pessoas que não podem pagar um advogado de confiança. “Diante de uma situação de tortura ou de violação de direitos, essa pessoa vai buscar um advogado contratado pela empresa A para demandar contra a empresa A. Evidentemente isso tudo está arquitetado de uma forma muito perversa”, alerta.
Segundo ele, interessa ao consórcio que, além de haver cada dia mais presos, os que já estão lá sejam mantidos por mais tempo. Uma das cláusula do contrato da PPP de Neves estabelece como uma das “obrigações do poder público” a garantia “de demanda mínima de 90% da capacidade do complexo penal, durante o contrato”. Ou seja, durante os 27 anos do contrato pelo menos 90% das 3336 vagas devem estar sempre ocupadas. A lógica é a seguinte: se o país mudar muito em três décadas, parar de encarcerar e tiver cada dia menos presos, pessoas terão de ser presas para cumprir a cota estabelecida entre o Estado e seu parceiro privado. “Dentro de uma lógica da cidadania, você devia pensar sempre na possibilidade de se ter menos presos e o que acontece ali é exatamente o contrário”, afirma Robson Sávio.
Para ele, “na verdade não se está preocupado com o que vai acontecer depois, se está preocupado com a manutenção do sistema funcionando, e para ele funcionar tem que ter 90% de lotação, porque se não ele não dá lucro”.
Para garantir a lei, a ordem e a imagem
Na foto, o complexo de Neves é realmente diferente das penitenciárias públicas. É limpo, organizado e altamente automatizado, repleto de câmeras, portões que são abertos por torres de controle, etc, etc, etc. Mas que tipo de preso vai pra lá? Hamilton Mitre, diretor do GPA afirma que “não dá pra falar que o Estado coloca os presos ali de forma a privilegiar o projeto”.
No entanto, Murilo Andrade de Oliveira, subsecretário de Administração Penitenciária do Estado de Minas, diz exatamente o contrário: “nós estabelecemos inicialmente o critério de que [pode ir para a PPP] qualquer preso, podemos dizer assim, do regime fechado, salvo preso de facção criminosa – que a gente não encaminha pra cá – e preso que tem crimes contra os costumes, estupradores. No nosso entendimento esse preso iria atrapalhar o projeto”.
Na visão dos outros entrevistados, a manipulação do perfil do preso pode ser uma maneira de camuflar os resultados da privatização dos presídios. “É muito fácil fazer desses presídios uma janela de visibilidade: ‘olha só como o presídio privado funciona’, claro que funciona, há todo um corte e uma seleção anterior”, diz Bruno Shimizu.
Robson Sávio explica que presos considerados de “maior periculosidade”, “pior comportamento” ou que não querem trabalhar ou estudar são mais difíceis de ressocializar, ou seja, exigiriam investimentos maiores nesse sentido. Na lógica do lucro, portanto, eles iriam mesmo atrapalhar o projeto.
Se há rebeliões, fugas ou qualquer manifestação do tipo, o consórcio é multado e perde parte do repassa de verba. Por isso principalmente o interesse em presos de “bom comportamento”. O subsecretário Murilo afirma ainda que os que não quiserem trabalhar nem estudar podem ser “devolvidos” às penitenciárias públicas: “o ideal seria ter 100% de presos trabalhando, esse é nosso entendimento. Agora, tem presos que realmente não querem estudar, não querem trabalhar, e se for o caso, posteriormente, a gente possa tirá-los (sic), colocar outros que queiram trabalhar e estudar porque a intenção nossa é ter essas 3336 vagas aqui preenchidas com pessoas que trabalhem e estudem”.
Hoje, na PPP de Ribeirão das Neves ainda não são todos os presos que trabalham e estudam e os que têm essa condição se sentem privilegiados em relação aos outros. A reportagem só pôde entrevistar presos no trabalho ou durante as aulas, não foi permitido falar com outros presos, escolhidos aleatoriamente. Foram mostradas todas as instalações da unidade 2 do complexo, tais como enfermaria, oficinas de trabalho, biblioteca e salas de aula, mas não pudemos conversar com presos que não trabalham nem estudam e muito menos andar pelos pavilhões, chamados, no eufemismo do luxo de Neves, de “vivências”.
O trabalho do preso: 54% mais barato
O Estado e o consórcio buscam empresas que se interessem com o trabalho do preso. As empresas do próprio consórcio não podem contratar o trabalho deles a não ser para cuidar das próprias instalações da unidade, como elétrica e limpeza. Então o lucro do consórcio não vem diretamente do trabalho dos presos, mas sim do repasse mensal do estado.
Mas a que empresa não interessaria o trabalho de um preso? As condições de trabalho não são regidas pela CLT, mas sim pela Lei de Execução Penal (LEP), de 1984. Se a Constituição Federal de 1988 diz que nenhum trabalhador pode ganhar menos de um salário mínimo, a LEP afirma que os presos podem ganhar ¾ de um salário mínimo, sem benefícios. Um preso sai até 54% mais barato do que um trabalhador não preso assalariado e com registro em carteira.
O professor Laurindo Minhoto explica: “o lucro que as empresas auferem com esta onda de privatização não vem tanto do trabalho prisional, ou seja, da exploração da mão de obra cativa, mas vem do fato de que os presos se tornaram uma espécie de consumidores cativos dos produtos vendidos pela indústria da segurança e da infra-estrutura necessária à construção de complexos penitenciários”.
Helbert Pitorra, coordenador de atendimento do GPA, na prática, quem coordena o trabalho dos presos, orgulha-se que o complexo está virando um “pólo de EPIs” (equipamentos de proteção individual), ou seja, um pólo na fabricação de equipamentos de segurança. “Eles fabricam dentro da unidade prisional sirenes, alarmes, vários circuitos de segurança, (…) calçados de segurança como coturnos e botas de proteção (…), além de uniformes e artigos militares”.
O que é produzido ali dentro, em preços certamente mais competitivos no mercado alimenta a própria infra-estrutura da unidade. A capa dos coletes à prova de balas que os funcionários do GPA usam é fabricada ali dentro mesmo, a módicos preços, realizados por um preso que custa menos da metade de um trabalhador comum a seu empregador.
Em abril deste ano, o Governo de Minas Gerais foi condenado por terceirização ilícita no presídio de Neves. A Justiça do Trabalho confirmou a ação civil pública do Ministério Público do Trabalho e anulou várias das contratações feitas pelo GPA.
“Entre os postos de trabalho terceirizados estão atividades relacionadas com custódia, guarda, assistência material, jurídica e à saúde, uma afronta à Lei 11.078/04 que classifica como indelegável o poder de polícia e também a outros dispositivos legais. Além de ser uma medida extremamente onerosa para os cofres públicos, poderá dar azo a abusos sem precedentes”, disse o procurador que atuou no caso, Geraldo Emediato de Souza, ao portal mineiro Hoje em dia.
Panorama final
Como na maioria das penitenciárias, as visitas do Complexo passam por revista vexatória. A., mulher de um detento que preferiu não se identificar, entregou à reportagem uma carta dos presos e explicou como é feita a revista: “temos que tirar a roupa toda e fazer posição ginecológica, agachamos três vezes ou mais, de frente e de costas, temos que tapar a respiração e fazer força. Depois ainda sentamos num banco que detecta metais”. Na mesma carta entregue por A., os presos afirmam que os diretores do presídio já têm seus “beneficiados”, que sempre falam “bem da unidade” à imprensa, e são, invariavelmente, os que trabalham ou estudam.
Na carta, eles ainda afirmam que na unidade já há presos com penas vencidas que não foram soltos ainda. Fontes que também não quiseram se identificar insistem que o consórcio da PPP já “manda” na vara de execuções penais de Ribeirão das Neves.
José de Jesus filho, da Pastoral Carcerária, não vê explicação para a privatização de presídios que não a “corrupção”.Tem seus motivos. Em maio de 2013, a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e a Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô) foram alvo de ações por corrupção e má utilização de recursos públicos. Na ação da CPTM foi citado o ex-diretor, Telmo Giolito Porto, hoje à frente do consórcio da PPP de Ribeirão das Neves, assim como a empresa Tejofran de Saneamento e Serviços Gerais LTDA., que faz parte do mesmo consórcio.
Nesse sentido, Robson Sávio alerta: “será que o estado quando usa de tanta propaganda para falar de um modelo privado ele não se coloca na condição de sócio-interesseiro nos resultados e, portanto, se ele é sócio-interesseiro ele também pode maquiar dados e esconder resultados, já que tudo é dado e planilha? Esse sistema ainda tem muita coisa que precisa ser mais transparente e melhor explicada”.
Pelo Brasil
O modelo mineiro de PPP já inspirou projetos semelhantes no Rio Grande do Sul, em Pernambuco e no Distrito Federal. As licitações já aconteceram ou estão abertas e, em breve, as penitenciárias começarão a ser construídas. O governo do Estado de São Paulo e a Secretaria de Administração Penitenciária também pretendem lançar em breve um edital para a construção de um grande complexo no Estado, com capacidade para 10.500 presos. O governador Geraldo Alckmin já fez consultas públicas e empresas já se mostraram interessadas no projeto.
No Ceará, uma decisão judicial obrigou à iniciativa privada devolver a gestão de penitenciárias para o Governo do estado. No Paraná, o próprio Governo decidiu retomar a administração de uma série de penitenciárias, após avaliar duas questões: a jurídica e a financeira.
No Brasil, país do “bandido bom é bandido morto”, da “bancada da bala” e onde presos não têm direitos simplesmente por estarem presos, a privatização também assusta do ponto de vista da garantia dos direitos humanos dos presos. “Será que num sistema que a sociedade nem quer saber e não está preocupada, como é o prisional, haverá fiscalização e transparência suficiente? Ou será que agora estamos criando a indústria do preso brasileiro?”, pergunta Sávio.
Os entrevistados dão um outro alerta: nesse primeiro momento, vai se investir muito em marketing para que modelos como o de Neves sejam replicados Brasil afora. Hamilton Mitre diz que a unidade será usada como um “cartão de visitas” e fontes afirmam que o modelo de privatização de presídios será plataforma de campanha de Aécio Neves, candidato à presidência nas eleições do fim deste ano.
Para Minhoto, a partir do momento em que você enraíza um interesse econômico e lucrativo na gestão do sistema penitenciário, “o estado cai numa armadilha de muitas vezes ter que abrir mão da melhor opção de política em troca da necessidade de garantir um retorno ao investimento que a iniciativa privada fez na área”, diz. E Bruno Shimizu completa “e isso pode fazer com que a gente crie um monstro do qual a gente talvez não vá mais conseguir se livrar”.
“Para quem investe em determinado produto, no caso o produto humano, o preso, será interessante ter cada vez mais presos. Ou seja, segue-se a mesma lógica do encarceramento em massa. A mesma lógica que gerou o caos, que justificou a privatização dos presídios”, arremata Patrick.
Para entender: dados e números
Brasil
- Existem no Brasil aproximadamente 550 mil presos.
- São aproximadamente 340 mil vagas no sistema prisional.
- O Brasil está em 4o lugar no ranking dos países com maior população carcerária no mundo, atrás de EUA, China e Rússia.
- Entre 1992 e 2012 o Brasil aumentou sua população carcerária 380%.
- Empresas dividem a gestão de penitenciárias com o poder público em pelo menos 22 presídios de sete estados: Santa Catarina, Minas Gerais, Espírito Santo, Tocantins, Bahia, Alagoas e Amazonas.
Minas Gerais- Em 2003 o Estado de Minas tinha aproximadamente 23 mil presos.- Em 10 anos essa população mais do que duplicou: hoje são 50 mil presos. - Em 2003 eram 30 unidades prisionais no Estado, hoje são mais de 100. - Em 2011 o Estado de Minas já gastava aproximadamente um bilhão de reais por ano com o sistema penitenciário.
O complexo de Ribeirão das Neves
- O consórcio Gestores Prisionais Associados (GPA), que ganhou a licitação do complexo penitenciário de Ribeirão das Neves é formado por cinco empresas, são elas:
CCI Construções S/A
Construtora Augusto Velloso S/A
Empresa Tejofran de Saneamento e Serviços LTDA
N. F. Motta Construções e Comércio
Instituto Nacional de Administração Penitenciária (INAP)
- Em 18 de janeiro de 2013 começaram a ser transferidos os primeiros presos para o Complexo Penitenciário de Ribeirão das Neves.
- A inauguração aconteceu no dia 28 de janeiro de 2013, com uma ala já ocupada por 75 presos. - Hoje (maio de 2014) estão funcionando duas das cinco unidades do complexo, cada uma com 672 presos.
- A capacidade do complexo é de 3336 vagas.
- O consórcio de empresas tem 27 anos da concessão do complexo, sendo dois para construção e 25 para operação. - Já foram gastos 280 milhões de reais na construção do complexo até agora. O GPA estima que no total serão gastos 380 milhões.
- O Estado repassa R$2.700 por preso mensalmente; nas penitenciárias públicas o custo é de R$ 1.300,00 a R$ 1.700,00 por mê - As celas têm capacidade máxima para quatro presos. - Detalhes sobre a PPP de Ribeirão das Neves e documentos podem ser acessados neste site.
16/06/2015 11h03
- Atualizado em
16/06/2015 14h22
Brasil tinha 23,1 mil jovens privados de liberdade em 2013, diz Ipea
Dados são do instituto e de órgão da Secretaria de Direitos Humanos.
Infrações mais comuns foram roubo, tráfico de drogas e latrocínio.
(Foto: Hmenon Oliveira/Agência Brasília)
(Correção: ao ser publicada, esta reportagem errou ao informar que 60% dos adolescentes infratores eram negros e 51% não frequentavam a escola em 2013. Esses dados, na verdade, são referentes a 2003. Também estava errada a informação de que 90% dos jovens infratores são homens; o percentual correto é 95%. A informação foi corrigida às 13h34.)
O levantamento aponta ainda que 95% dos adolescentes infratores cumprindo medida socioeducativa são do sexo masculino e mais da metade das infrações registradas foram cometidas por jovens entre 16 e 18 anos.
saiba mais
Cerca de 40% das infrações cometidas eram por roubo, 23,5% por tráfico
de drogas, 8,75% por latrocínio (roubo seguido de morte), 3,4% por
furto, 1,1% por estupro e 0,9% por lesão corporal.De acordo com o levantamento, os estados com maior número de adolescentes cumprindo medidas socioeducativas em regime fechado em 2012, ano com dados mais recentes nesse tópico, eram São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco e Ceará.
A região Sul possui a maior porcentagem de adolescentes internados por homicídio e latrocínio – 451 jovens, ou 20% do total. O Nordeste possui o maior número absoluto de adolescentes reincidentes, que cumprem medidas pelos mesmos delitos praticados – 869 (17% do total).
Mais da metade dos adolescentes internados no Norte (51%) e Centro-Oeste (52%) cometeram atos como roubo e furto. As duas regiões tinham as menores taxas de delitos relacionados ao tráfico de drogas – 7% e 12%, respectivamente.
Para a técnica em Planejamento e Pesquisa do Ipea, Enid Rocha, o número de adolescentes internados poderia ser bem menor. "De 23 mil adolescentes privados de liberdade, apenas 8,7% são por homicídio, e existe uma orientação do ECA de que a privação de liberdade deve ser aplicada apenas em ato de violência de alta gravidade."
“Quando vamos olhar, apenas 3,2 mil meninos estão privados de liberdade por delitos relacionados a homicídios, latrocínios, estupro e lesão corporal. O restante está privado de liberdade por atos como furto, tráfico de drogas, que não justificaria a severidade da medida", disse.
“Não sabemos o que levou o Judiciário a aplicar essas medidas, mas reconhecemos que há dificuldades. (...) Nós temos um problema no país que não conhecemos verdadeiramente esses meninos e meninas então há necessidade de o país em investir em dados", declarou.
O levantamento aponta ainda que a maior parte dos centros de internação não separa internos provisórios dos definitivos nem por idade, tipo físico ou por infração cometida, como determina o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Fugas e mortes
Entre março de 2012 e março de 2013, foram registradas as fugas de 1.560 adolescentes que cumpriam medidas socioeducativas no país, mostra o estudo. Os dados do Sinase apontam que neste período 30 adolescentes morreram.
Reduzir maioridade penal é jogar juventude nas mãos do crime organizado, diz presidenta da Fundação Casa
Criado em 16/06/15 18h02
e atualizado em 16/06/15 17h59
Por Luciano Nascimento Edição:Stênio Ribeiro Fonte:Agência Brasil
Uma eventual diminuição da
maioridade penal de 18 para 16 anos levaria a uma maior cooptação dos
adolescentes por parte do crime organizado, disse hoje (16) a presidenta
da Fundação Casa de São Paulo, Berenice Maria Gianella. A instituição,
responsável pelos adolescentes privados de liberdade no estado, abriga
cerca de 50% dos adolescentes internados no país. “Nós vamos jogar essa
juventude nas mãos do crime organizado, para servir ao tráfico e para
outras coisas que eles queiram”, disse Berenice.Por Luciano Nascimento Edição:Stênio Ribeiro Fonte:Agência Brasil
De acordo com ela, em São Paulo, o número de jovens que praticam crimes é bem menor que o número de adultos. De cada 100 pessoas privadas de liberdade 87 são adultos e 13 são adolescentes. Segundo ela, dos 9.260 adolescentes privados de liberdade, 95% são homens e 5%, mulheres. Entre os delitos cometidos por adolescentes, o roubo aparece em primeiro lugar (43%), seguido do tráfico (39%), crimes como o homicídio, latrocínio e estupro respondem por cerca de 1% dos crimes.
“Depois de 10 anos à frente da Fundação Casa, convivendo diariamente com adolescentes [infratores] e estudando cada vez mais o assunto, o que eu posso frisar é que a redução [da maioridade] não vai levar à diminuição da prática de atos infracional por adolescentes. O consenso de que reduzir a maioridade vai reduzir a criminalidade não é verdadeiro”, complementou Berenice durante audiência pública na Câmara dos Deputados para debater o tema. “Me chama a atenção o número de crimes hediondos. Temos 268 respondendo por crimes hediondos, não chega a 3% dos que praticaram homicídio, estupro e outros", ressaltou.
A redução da maioridade tem gerado muitos debates, às vezes com posições extremadas. Amanhã (17), a comissão mista da Câmara dos Deputados poderá votar o relatório do deputado Laerte Bessa (PR-DF) a uma proposta de emenda à Constituição (PEC 171/93) que reduz de 18 para 16 anos a maioridade penal.
Segundo o juiz da Infância e Juventude de Porto Alegre (RS), João Batista Costa Saraiva, caso a redução seja aprovada, cerca de 60 mil adolescentes serão lançados em presídios. Saraiva criticou a forma como o debate vem sendo conduzido sem dados precisos. “É lamentável que se pretenda vender para a sociedade uma expectativa de segurança a partir da redução. Isso não vai mudar em nada. Eu não acho razoável que um debate dessa natureza seja conduzido de forma tão irresponsável, através de um achismo, sem dados estatísticos claros”, argumentou.
Segundo Saraiva, são falas as argumentações de que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) promova a impunidade de adolescentes que cometem atos infracionais, e defendeu alterações no estatuto como o aumento do tempo máximo de internação, que hoje é de três anos. “Não estou dizendo que o ECA seja intocável, ou que não tenha defeitos, mas ele precisa ser aprimorado, de forma que respeite os compromissos do Brasil com suas crianças e adolescentes, com a comunidade internacional", sentenciou.
Na manhã desta terça-feira, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse que o governo também defende um tempo maior de internação para jovens que praticarem crimes hediondos, com violência ou grave ameaça, como alternativa à redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. Cardozo disse que a redução da maioridade penal é um equívoco, e pode provocar caos no sistema penitenciário, que tem déficit de 300 mil vagas.
Quase metade das mortes de adolescentes de 16 e 17 anos no Brasil em
2013 tiveram como causa o homicídio, segundo o estudo "Mapa da
Violência: Adolescentes de 16 e 17 anos" do Brasil, divulgado nesta
segunda-feira (29) em Brasília.
Foram 3.749 jovens nessa faixa etária vítimas de homicídios, 46% do total de 8.153 óbitos, diz o estudo de autoria do sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz. A média é de 10,3 adolescentes assassinados por dia no país. As outras causas foram acidentes de transporte (13,9%) e suicídios (3,5%).
A projeção é que 3.816 serão mortos em 2015, diz o autor, e a metade dessas mortes seja por homicídio.
Esse tipo de causa externa (mortes que não são de causas naturais) aumentou 496% em relação a 1980, quando o homicídio representava apenas 9,7% do total de mortes.
Em comparação às outras causas, nesse mesmo período os suicídios aumentaram 45,5% e os acidentes de transporte cresceram 38,3%.
Na faixa de 16 e 17 anos, a taxa de mortalidade ficou em 54,1 homicídios por 100 mil adolescentes em 2013, um aumento de 2,7% em relação a 2012 e de 38,3% na década.
O Brasil ocupa o 3º lugar em relação a 85 países no ranking de mortes de adolescentes de 15 a 19 anos, perdendo apenas para México e El Salvador. São 54,9 mortes a cada 100 mil jovens.
Perfil
A maioria das vítimas é do sexo masculino (93%) com quatro até sete anos de estudo (62,1%). Proporcionalmente, morreram quase três vezes mais negros do que brancos.
O principal instrumento utilizado nas agressões foi a arma de fogo, presente em 81,9% dos homicídios de adolescentes de 16 anos e em 84,1% dos de 17 anos. Em seguida estão instrumentos cortantes, como facas e estiletes, com 10%.
Regiões
Os maiores índices de violência estão no Nordeste, com uma taxa de 73,3 jovens mortos a cada 100 mil, e Centro-Oeste, com 65,3.
No Rio Grande do Norte, Ceará e Roraima, as taxas mais que quadruplicam na década. São Paulo, Pernambuco e Rio de Janeiro tiveram redução.
As maiores taxas de homicídio entre adolescentes de 16 e 17 anos nas cidades estão na Bahia: Simões Filho, Lauro de Freitas e Porto Seguro.
No Maranhão está o maior índice de vitimização de negros: 1.188%. Isso siginifica que, proporcionalmente, morrem 13 negros por cada branco naquele estado. Em seguida, aparecem a Bahia, com 12 negros por cada branco; Sergipe e Alagoas, com taxas de nove negros por cada branco.
Os dados utilizados estão no Sistema de Informações de Mortalidade (SIM) da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), do Ministério da Saúde.
O
sistema de execução penal brasileiro e os métodos de cumprimento de
pena desrespeitam a legislação em vigor e precisam passar por reforma. É
o que revela estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplica (Ipea) a
pedido do Conselho Nacional de Justiça para traçar o perfil do
reincidente criminal e avaliar se as prisões estão cumprindo tanto a
função punitiva quanto ressocializadora, devolvendo cidadãos
reintegrados à sociedade.
O estudo conclui que, embora a Lei de Execução Penal (LEP) seja considerada moderna, o Estado não consegue cumpri-la, causando falhas e distorções que agravam a situação dos apenados e abrem caminho para a reincidência. A pesquisa destaca que um dos principais desafios é superar o conceito de prisão apenas como punição, investindo no caráter de reintegração previsto em lei.
Para o coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas do CNJ, juiz auxiliar Luís Geraldo Sant’Ana Lanfredi, embora a lei busque transformar a conduta daquele que cometeu crime, a aplicação fica no campo de ideias.
“Quando o Estado deixou de confiar nas virtudes da LEP, investindo simplesmente em punição e sem atentar para o modo, a qualidade e a maneira como essa resposta deve acontecer, perdemos o foco do que havia de mais significativo em uma legislação que buscava a reconciliação do autor de um crime com a sociedade”, disse.
Violações
Entre as violações encontradas pelos pesquisadores estão a superlotação, descaso com o preso provisório e mistura com os condenados, assim como entre os detidos por diferentes tipos penais.
A pesquisa também indica falta de diálogo entre os atores envolvidos e dificuldades operacionais e de pessoal, como falhas no monitoramento dos regimes semiaberto e aberto e desvalorização e falta de preparo de agentes penitenciários e profissionais de assistência.
O principal problema identificado, no entanto, é a falta de ações efetivas voltadas ao detentos, conforme determina a LEP, e antes disso, políticas preventivas voltadas aos jovens, principal alvo da criminalidade.
Saídas
A pesquisa sugere que o Estado se empenhe no combate à ociosidade do preso investindo na ampliação de oportunidades de trabalho e estudo (hoje existem, mas faltam vagas) e atue para reduzir o estigma dos ex-condenados junto à sociedade.
O levantamento diz ainda ser necessário o desenvolvimento de um plano nacional de execução penal e de planos estaduais para regulamentar e padronizar o tratamento penal.
Outras sugestões são políticas de reintegração do egresso na sociedade baseadas no tipo de crime cometido, atuação de conselhos de comunidade junto às varas de execução penal, programas e projetos que atentem para condição juvenil do preso e mais informações e avaliações para embasar políticas públicas.
Metodologia
Os pesquisadores fizeram uma análise quantitativa com o perfil do reincidente e depois foram a campo avaliar as condições de execução penal em três unidades da federação, conversando com juízes, gestores, profissionais de assistência e os próprios presos. As unidades não foram identificadas para evitar críticas direcionadas, considerando o caráter nacional dos problemas enfrentados pelo sistema carcerário.
Partindo das regras da LEP, a equipe de campo avaliou condições de assistência à saúde, psicológica, social, jurídica, religiosa e material, além da assistência educacional e ao trabalho. Também foi apurada a situação do egresso e a visão dos profissionais do sistema penal e dos condenados sobre reintegração e reincidência. Com informações da Assessoria de Imprensa do CNJ.
Clique aqui ver a íntegra da pesquisa.
Foram 3.749 jovens nessa faixa etária vítimas de homicídios, 46% do total de 8.153 óbitos, diz o estudo de autoria do sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz. A média é de 10,3 adolescentes assassinados por dia no país. As outras causas foram acidentes de transporte (13,9%) e suicídios (3,5%).
Taxa de homicídio (por 100 mil) de adolescentes de 16 e 17 anos por estado |
|
---|---|
AL | 147 |
ES | 140,6 |
CE | 108 |
RN | 98,1 |
DF | 83,3 |
GO | 83,1 |
PB | 80,2 |
SE | 78 |
BA | 73,5 |
AP | 71 |
RJ | 62,5 |
PA | 62,1 |
PE | 56,1 |
MT | 55,4 |
BR | 54,1 |
AM | 51,9 |
MG | 51,2 |
PR | 45,4 |
MA | 39,3 |
RR | 34,8 |
RS | 32,2 |
MS | 32 |
PI | 31,8 |
AC | 27,7 |
RO | 23,5 |
SP | 21,3 |
SC | 17,3 |
TO | 13,8 |
Fonte: Mapa da Violência: Adolescentes de 16 e 17 anos do Brasil/ Dados de 2013 |
Esse tipo de causa externa (mortes que não são de causas naturais) aumentou 496% em relação a 1980, quando o homicídio representava apenas 9,7% do total de mortes.
Em comparação às outras causas, nesse mesmo período os suicídios aumentaram 45,5% e os acidentes de transporte cresceram 38,3%.
Na faixa de 16 e 17 anos, a taxa de mortalidade ficou em 54,1 homicídios por 100 mil adolescentes em 2013, um aumento de 2,7% em relação a 2012 e de 38,3% na década.
O Brasil ocupa o 3º lugar em relação a 85 países no ranking de mortes de adolescentes de 15 a 19 anos, perdendo apenas para México e El Salvador. São 54,9 mortes a cada 100 mil jovens.
Perfil
A maioria das vítimas é do sexo masculino (93%) com quatro até sete anos de estudo (62,1%). Proporcionalmente, morreram quase três vezes mais negros do que brancos.
O principal instrumento utilizado nas agressões foi a arma de fogo, presente em 81,9% dos homicídios de adolescentes de 16 anos e em 84,1% dos de 17 anos. Em seguida estão instrumentos cortantes, como facas e estiletes, com 10%.
Regiões
Os maiores índices de violência estão no Nordeste, com uma taxa de 73,3 jovens mortos a cada 100 mil, e Centro-Oeste, com 65,3.
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Nos estados, lideram esse ranking Alagoas, Espírito Santo e Ceará. As menores taxas estão em Tocantins, Santa Catarina e São Paulo.No Rio Grande do Norte, Ceará e Roraima, as taxas mais que quadruplicam na década. São Paulo, Pernambuco e Rio de Janeiro tiveram redução.
As maiores taxas de homicídio entre adolescentes de 16 e 17 anos nas cidades estão na Bahia: Simões Filho, Lauro de Freitas e Porto Seguro.
No Maranhão está o maior índice de vitimização de negros: 1.188%. Isso siginifica que, proporcionalmente, morrem 13 negros por cada branco naquele estado. Em seguida, aparecem a Bahia, com 12 negros por cada branco; Sergipe e Alagoas, com taxas de nove negros por cada branco.
Os dados utilizados estão no Sistema de Informações de Mortalidade (SIM) da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), do Ministério da Saúde.
Gargalos do cárcere
Execução penal é falha e deve ser reformada, diz pesquisa do Ipea
O estudo conclui que, embora a Lei de Execução Penal (LEP) seja considerada moderna, o Estado não consegue cumpri-la, causando falhas e distorções que agravam a situação dos apenados e abrem caminho para a reincidência. A pesquisa destaca que um dos principais desafios é superar o conceito de prisão apenas como punição, investindo no caráter de reintegração previsto em lei.
Para o coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas do CNJ, juiz auxiliar Luís Geraldo Sant’Ana Lanfredi, embora a lei busque transformar a conduta daquele que cometeu crime, a aplicação fica no campo de ideias.
“Quando o Estado deixou de confiar nas virtudes da LEP, investindo simplesmente em punição e sem atentar para o modo, a qualidade e a maneira como essa resposta deve acontecer, perdemos o foco do que havia de mais significativo em uma legislação que buscava a reconciliação do autor de um crime com a sociedade”, disse.
Violações
Entre as violações encontradas pelos pesquisadores estão a superlotação, descaso com o preso provisório e mistura com os condenados, assim como entre os detidos por diferentes tipos penais.
A pesquisa também indica falta de diálogo entre os atores envolvidos e dificuldades operacionais e de pessoal, como falhas no monitoramento dos regimes semiaberto e aberto e desvalorização e falta de preparo de agentes penitenciários e profissionais de assistência.
O principal problema identificado, no entanto, é a falta de ações efetivas voltadas ao detentos, conforme determina a LEP, e antes disso, políticas preventivas voltadas aos jovens, principal alvo da criminalidade.
Saídas
A pesquisa sugere que o Estado se empenhe no combate à ociosidade do preso investindo na ampliação de oportunidades de trabalho e estudo (hoje existem, mas faltam vagas) e atue para reduzir o estigma dos ex-condenados junto à sociedade.
O levantamento diz ainda ser necessário o desenvolvimento de um plano nacional de execução penal e de planos estaduais para regulamentar e padronizar o tratamento penal.
Outras sugestões são políticas de reintegração do egresso na sociedade baseadas no tipo de crime cometido, atuação de conselhos de comunidade junto às varas de execução penal, programas e projetos que atentem para condição juvenil do preso e mais informações e avaliações para embasar políticas públicas.
Metodologia
Os pesquisadores fizeram uma análise quantitativa com o perfil do reincidente e depois foram a campo avaliar as condições de execução penal em três unidades da federação, conversando com juízes, gestores, profissionais de assistência e os próprios presos. As unidades não foram identificadas para evitar críticas direcionadas, considerando o caráter nacional dos problemas enfrentados pelo sistema carcerário.
Partindo das regras da LEP, a equipe de campo avaliou condições de assistência à saúde, psicológica, social, jurídica, religiosa e material, além da assistência educacional e ao trabalho. Também foi apurada a situação do egresso e a visão dos profissionais do sistema penal e dos condenados sobre reintegração e reincidência. Com informações da Assessoria de Imprensa do CNJ.
Clique aqui ver a íntegra da pesquisa.
A Constituição Federal, a Lei de Execução Penal e o preso - 7 informações básicas sobre encarceramento
Aumentar Fonte:
O preso adquiriu o status jurídico de sujeito de direitos. Trata-se de
conquista histórica, obtida graças ao desenvolvimento do princípio da
humanidade, que começou a firmar-se no primeiro quartel do século XX. A
pessoa presa deixou de ser vista como objeto da execução penal ou do
processo. A principal consequência dessa condição para o condenado e o
para preso provisório foi a afirmação de suas respectivas humanidades,
isto é, o reconhecimento de que são seres humanos, todavia, presos, um
status que lhes é inalienável, por mais abjeto que seja o crime
praticado pelo condenado, por mais repulsivo que seja o delito do qual o
preso é acusado. A segunda consequência mais importante é a de que o
preso passouo a manter com o Poder Público que o custodia uma “relação
jurídica de especial sujeição”. Ou seja, o preso tem direitos perante a
administração carcerária e deveres que deve observar, estando sujeito às
determinações da administração penitenciária.
Não é simples, nem é fácil a introjeção desses novos conceitos. No Brasil, em fins dos anos 70, e portanto, em fins da ditadura militar, surgiu espaço político para a discussão aberta sobre a condição dos indivíduos presos. Essa abertura para o diálogo possibilitou a promulgação da Lei de Execução Penal (LEP), que dispõe sobre a execução das penas, tanto administrativamente, como judicialmente.
Em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, foram inseridos no art. 5º diversas garantias para a pessoa presa. É importante lembrar que o art. 5º da Constituição Federal traz extenso rol de garantias de todo e qualquer cidadão contra o Estado, e por isso são denominadas “direitos e garantis fundamentais”.
São as seguintes as garantias do preso inscritas no art. 5º:
“III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
(...)
XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;
XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos;
XLVII - não haverá penas:
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados;
d) de banimento;
e) cruéis;
XLVIII - a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado;
XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;
L - às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação;
(...)
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
(...)
LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;
LXII - a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada;
LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;
LXIV - o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial;
LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária;
LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança;
LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel;
LXVIII - conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;
(...)
LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença;”.
Tais garantias, por possuírem nível constitucional, compõem a mais alta esfera de direitos no Brasil.
Além dessas garantias, existem outras, decorrentes de tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário e que possuem nível constitucional. Consulte-as no menu “marcos legais”.
A LEP é uma lei federal, a de nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Dispõe de modo minucioso sobre como deve se desenvolver qualquer aprisionamento no Brasil, além de dispor sobre as penas não privativas de liberdade.
Quanto ao descumprimento da Constituição Federal, dos Tratados Internacionais e da LEP, a comunidade científica – de modo geral – aponta o fato de que o Brasil ainda é considerado uma democracia jovem.
Não é simples, nem é fácil a introjeção desses novos conceitos. No Brasil, em fins dos anos 70, e portanto, em fins da ditadura militar, surgiu espaço político para a discussão aberta sobre a condição dos indivíduos presos. Essa abertura para o diálogo possibilitou a promulgação da Lei de Execução Penal (LEP), que dispõe sobre a execução das penas, tanto administrativamente, como judicialmente.
Em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, foram inseridos no art. 5º diversas garantias para a pessoa presa. É importante lembrar que o art. 5º da Constituição Federal traz extenso rol de garantias de todo e qualquer cidadão contra o Estado, e por isso são denominadas “direitos e garantis fundamentais”.
São as seguintes as garantias do preso inscritas no art. 5º:
“III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
(...)
XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;
XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos;
XLVII - não haverá penas:
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados;
d) de banimento;
e) cruéis;
XLVIII - a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado;
XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;
L - às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação;
(...)
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
(...)
LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;
LXII - a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada;
LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;
LXIV - o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial;
LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária;
LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança;
LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel;
LXVIII - conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;
(...)
LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença;”.
Tais garantias, por possuírem nível constitucional, compõem a mais alta esfera de direitos no Brasil.
Além dessas garantias, existem outras, decorrentes de tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário e que possuem nível constitucional. Consulte-as no menu “marcos legais”.
A LEP é uma lei federal, a de nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Dispõe de modo minucioso sobre como deve se desenvolver qualquer aprisionamento no Brasil, além de dispor sobre as penas não privativas de liberdade.
Quanto ao descumprimento da Constituição Federal, dos Tratados Internacionais e da LEP, a comunidade científica – de modo geral – aponta o fato de que o Brasil ainda é considerado uma democracia jovem.